Por que então falo de “prudente otimismo”?
Porque o patamar do mínimo denominador comum está sendo incrementado: pela
primeira vez quase todos países terão algum tipo de meta por mais capenga que
seja. Isso representa a quebra do paradigma de Kioto que isentava os “em
desenvolvimento” de reduzir suas emissões. Instaurando-se o processo de “ciclos
de revisão” quinquenais para rever metas no sentido de mais ambição elas
poderão evoluir mais a frente. Um bom exemplo é o próprio Brasil: uma primeira
meta, meio fuleira, a partir de Copenhagen, de “desvio sobre uma projeção de emissões” --sobre
estimativas de superdimensionadas de emissões e de PIB-- dá lugar agora a uma meta de redução no
agregado. Esse processo fica explícito na proposta brasileira de evolução em
“círculos concêntricos” que parece com boas chances de ser aceita. Ela prevê a
evolução das metas dos países em desenvolvimento do “desvio de curva” e da
“intensidade de carbono por ponto percentual do PIB” para um círculo final de
redução no agregado, ao final. O mínimo denominador comum da COP 21, portanto, promete melhorias incrementais cíclicas
crescentes e esse seria um dos seu bons legados.
Mas o que fazer então com as 12 Gt que sobram?
Aí temos duas varáveis em colisão: o
quanto dos INDC será cumprido de fato? O quanto de emissões será abatido nos
processos cíclicos de emissões? A primeira pergunta é embaraçosa, inclusive
para o Brasil. É a tal “diferença entre intenção e gesto”. Somos, a justo
título, comparativamente falando, um dos países mais avançados. Mas chegamos na
COP 21 com um aumento de 16% do desmatamento que nessas alturas do campeonato deveria já estar caindo
solidamente abaixo dos 5 mil km2. Isso embora muito menos que os 27 mil km2, dos anos
90, ainda é obscenamente elevado.
Ao final, ainda sobram essas gigatoneladas que
terão que ser abatidas por ações em duas frentes distintas: um esforço
específico, adicional, dentre grandes emissores (países e empresas) e,
sobretudo, a criação de robustos mecanismos econômicos novos como o da
precificação positiva da redução de carbono: o reconhecimento do valor econômico
intrínseco da redução de carbono via ações de mitigação para o qual os primeiros
passos estão sendo dados na COP 21.
A
necessária utopia de 1.5 graus
Nesse
contexto como se encaixa essa reivindicação por um limite de aumento de
temperatura de 1.5 graus formulado pelas ilhas ameaçadas e que vem ganhando
apoios e tração na COP 21?
À luz das informações que temos hoje o limite
de 2 graus já é bastante difícil de ser alcançado. O conjunto dos INDC, caso
religiosamente cumprido, dá esse déficit
de 12 Gt e aponta para algo próximo de 3 graus. Com um grau de aumento de
“apenas” um grau, desde o século XIX, já notamos as gravíssimas consequências.
Imagine-se 2! Imagine-se 3! No presente
estágio de conhecimento científico-tecnológico,
1.5 parece praticamente inalcançável salvo recurso à geoengenharia (espalhamento de
sulfetos na atmosfera imitando processos vulcânicos que no passado
esfriaram o planeta) ou a invenção de
técnicas que retirem carbono da atmosfera massivamente como uma réplica artificial
do que oceanos e florestas fazem naturalmente. Há pesquisas nesse sentido mas, até
agora, nada numa escala maior. O grande
problema é que o CO2 uma vez emitido permanece séculos na atmosfera (o metano,
décadas) o que nos faz numa grande medida prisioneiros do passado.
A geoengenharia, até o momento, é vista com
muita reserva pela maioria dos cientistas com quem dialogo. Os equipamentos ou
processos para absorver carbono massivamente ainda são uma promessa longínqua.
No entanto, está patente a necessidade histórica de 1.5 graus. Assim como se
estabelecem os ciclos de revisão é preciso estabelecer esse objetivo como uma
meta de alguma forma evocada no acordo a ser produzido em Paris.
Já vamos precisar de processos exponenciais
para chegar nos 2 graus. E a característica do exponencial, me perdoem o
tautologismo, é ser... exponencial.
Portanto vale a pena apostar no engenho humano: se a curva de redução
puder se direcionar para 2 graus, poderá, adiante, ir além pois isso significará que nossa civilização
se direcionando resolutamente para o carbono-zero. A ciência poderá eventualmente
criar meios de retirar CO2 da atmosfera se a finança do baixo carbono mobilizar
meios suficientes para paga-lo.
Tudo isso, seja 2, seja 1.5, dependerá de uma mobilização massiva de
recursos, de trilhões de dólares-ano. Até agora a briga é em torno de 100
bilhões para 2020, dos quais apenas 10 bi já se materializaram. Como fazer
frente a essa situação e quais os mecanismos disponíveis e aqueles as ser criados é assunto para o meu próximo
artigo.
No
momento vamos ficar com nosso alvo, utópico mas indispensável: na COP 21
queremos menção a um limite de 1.5
graus!
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