(Bonn) É recorrente às COP essa sensação de estar
girando em falso, de muita conversa pouca ação e menos ainda resultado. Há
conferências onde se sente um pequeno progresso palpável, aquém do necessário,
mas progresso, afinal. Ele nem sempre vem do processo negociador,
frequentemente de algum avanço políticos em um país importante ou um registro
de redução de emissões global ou nacional. Nada disso acontece na COP 23. Sua
pauta nada tem de muito substantivo, trata-se de esmiuçar aplicação do Acordo
de Paris, o manual de implementação de suas regras a discussão de como
discutir. No entanto, o contexto político e científico internacional produz más
noticias que são reverberadas dentro da COP.
Vínhamos
acompanhando com interesse a possibilidade de as emissões por queima de
combustível fóssil terem atingido o seu “pico” em 2013 já que elas vinham
estáveis --e até com uma ligeira queda--
coincidindo com anos de crescimento do PIB mundial. Isso é importante
pois já havíamos tido, no passado, redução de emissões de CO2 mundiais mas sempre
em anos recessivos. Dessa vez havia algo diferente. Agora, cientistas do Carbon
Budget Project anunciam uma projeção de aumento de 2% das emissões, em 2017, o que seria o primeiro aumento, no agregado,
desde a estabilização. Isso teve um efeito de ducha fria. Corresponderia a um
aumento de emissões de mais de 3%, na China, dado um uso mais intrenso de suas
térmicas a carvão por causa da seca afetando hidroelétricas (algo com tendência
a ser repetir) e de uma redução menor nos EUA onde o “efeito Trump” ainda não
apareceu mas poderá, mais adiante, em
função da desregulamentação das normas nacionais da EPA(Agencia Ambiental Federal).
Cabem
certas ressaltas. Primeiro é uma estimativa, o ano ainda não acabou e ela está
num patamar menor do que a margem de erro. Além disso a fonte que vem
registrando com o precisão as emissões de CO2, por queima de combustível fóssil,
é a Agencia Internacional de Energia
(IEA) assim que, para seguirmos a série
histórica, teríamos que ter seus dados e
não comparar dados de fontes diferentes. Por outro lado, as emissões por
energia são a parte do leão dos gases-estufa mas apenas essa parte. Teríamos
que acrescentar as emissões por desmatamento que, em 2015 e 2016, aumentaram no Brasil e na Indonésia, e as
“exponenciais” provenientes da decrescente capacidade dos oceanos e florestas
de arbsorverem carbono, das geleiras derretendo e do permafrost liberando metano (CH4). Tanto, que apesar dessa estabilização nos relatórios de emissões
de CO2/energia, a concentração de gases-estufa na atmosfera medidas em “partes
por milhão” (ppm) continuaram a subir em todo esse período. Já andamos pelos
401 ppm e em alguns observatórios já se detectaram concentrações de 407 ppm.
Lidamos
com uma situação geopolítica adversa. Trump parece muito isolado mas acaba
inspirando outros países carvoeiros como a Polônia que agora canta de galo mais
alto com seu governo de extrema-direita disposto a resistir mais às pressões
europeias. A próxima COP, que irá abrir a discussão da descarbonização de logo
prazo, a COP 24, será em Katovice, o locus
de uma enorme siderurgica da época do comunismo, a Huta Katovicza, em uma região cuja economia ainda depende
bastante do carvão. Não vai surpreender ninguém se ocorrerem, no ano que vem, manifestações
carvoreiras contra a COP com crucifixos e fotos do Trump, despezado ao redor do
planeta mas admirado na Polônia que assim irá sediar --sabe Deus porquê-- sua terceira COP.
Um dado
interessante em Bonn atual vem sendo o ativismo do governdor Jerry Brown
que junto com seu antecessor, Arnold
Schwarzenegger, vem estrelando numerosos eventos em representação do que eu chamaria
de U(d)SA: United Decarbonizing States
of America, que formam a quinta economia do mundo. Brown negocia diretamente
com a China, agita incessantemente as plateias mas deixa transparecer uma certa
angústia. No evento da IRENA que participei, mencionou o “duelo entre o
pessimismo do intelecto e o otimismo do coração, de um pensador que não vou
aqui mencionar”. Referia-se evidentemente ao filosofo italiano Antonio Gramsci que
por prudência não nominou para que a mídia não o acuse de comunista.
O clima
da COP é de uma certa deprê e sua supreendente má organização não ajuda muito.
Distâncias enormes, péssima sinalização grande perda de tempo o tempo todo. A
proverbial organização alemã dessa vez não compareceu. Saudades de Marakerch.
Ah, os marroquinos, esses sim, sabiam como organizar uma COP...
Já o
Brasil, procupa. Poderia estar trazendo razoáveis noticias com a inflexão do
desmatamento na Amazônia que, depois de dois anos horríveis, apresenta agora
queda de 16% segundo o PRODES. Mas o foco das atenções de dirige para a
esduxula MP 759, tramitando no
Congresso, que quer subsidiar a indústria de petróleo em quase um trilhão de
reais até 2040. Laurance Tubiana, que co-presidiu a Conferencia de Paris me
perguntou: “que loucura é essa? Isso é verdade???” Expliquei que ainda fazia
parte das (más) intenções e que essa MP, se não for aprovada até dezembro, cai.
Trata-se então de balançar o pé de jaca!
MP 795, um subsídio na
contramão
A austeridade, no Brasil, tem sido feroz. Até
as doações obtidas a fundo perdido para a proteção do meio ambiente, com
aquelas do Fundo Amazônia, quando se destinam a órgãos públicos, caem sob os
efeitos do “contingenciamento” como se orçamento fossem. Acabam congeladas. Uma
austeridade feroz...e burra. Pois tem a chancela do arauto dessa austeridade, a
do ministro Henrique Meireles, o maior desperdício da nossa história incarnado
na MP 795/17 que dá de mão beijada à indústria do petróleo quase um trilhão de
reais em subsídios, até 2040. A MP original foi enviada algo sorrateiramente,
sem consulta ao Ministério do Meio Ambiente, em agosto, e demorou em ser
identificada na sua maligna enormidade. O relator, deputado Júlio Lopes
conseguiu piora-la ainda mais estendendo sua vigência. Agora ela precisa ser
votada até dezembro para não seguir para seu lugar merecido, a lata de lixo da
história. Por isso, há quem queira
vota-la por agora, possivelmente para melhor queimar o filme da Brasil na COP
23, em Bonn.
O
petróleo encontra-se no limiar de uma lenta mas
profunda implosão. Antes mesmo da decisão da indústria automobilística
global de entrar de cabeça na era da eletrificação, o seu preço já se
estabilizara num patamar baixo pelo excesso de oferta que os recentes cortes de produção da OPEP não remediaram.
Sua agonia certamente será mais lenta e longa que a do carvão mas é
inevitável, inexorável. Até porque para
a humanidade ter a menor chance de conter a temperatura do planeta abaixo dos
dois graus –quanto mais 1.5-- será
preciso manter enterrados cerca de 60% das atuais reservas identificadas.
Futuramente esse petróleo não extraído possivelmente terá valor enquanto stranded asset: recurso interdito. Cientes dessa situação, grandes produtores como a Noruega, mas também a própria Arábia Saudita, buscam vários tipos alternativas para um
futuro menos petrodependente. Mas no Brasil, esse país de fantasia que se julga
o futuro Texas do início século 20, ainda imagina-se poços off shore do Pre Sal qual novo Eldorado. Ufanemo-nos brasileiros
que esse ainda será um grande motor do
nosso desenvolvimento. Voltaremos ao Poço do Visconde, de Monteiro Lobato.
Podes crer, Jeca Tatu...
Essa
confiança cega na perenidade do combustível fóssil não chega ao ponto de
admitir o “livre jogo” do capitalismo como senhor do seu destino. Não confia
mais no próprio taco. Duvida de suas peremptórias verdades mas não dá o braço a
torcer. Um pânico interior o faz se pendurar, mais uma vez, qual playboy
perdulário, na bolsa da Viúva. Um país em profunda recessão, submetido a essa
feroz austeridade que enxota até as doações recebidas para sublinhar sua
radicalidade, deverá subsidiar generosa e duradouramente essa
indústria não obstante sua prometida obsolescência e não obstante o consenso
internacional sublinhado até pelo FMI de que é fundamental ir acabando com todo
tipo de subsídios a combustível fóssil?
Globalmente são mais de 650 bilhões anuais em subsídios diretos e mais
de 5 trilhões, indiretos, o que inclui os custos de saúde e outros de suas
externalidades negativas climáticas e ambientais, locais, nas quais se inclui sete milhões de mortes
prematuras, em todo planeta, por conta
do ar poluído. Não há mais o que dizer sobre a MP 795 a não ser que seu lugar é
na lata de lixo da história.
No Amazon Too Big to Fail
Outonais
Governador da Califórnia Jerry Brown
Com Zequinha e Raoni
Nenhum comentário:
Postar um comentário