(Paris) Para
quem está acostumado às conferências do Clima da ONU, as COP, o One Planet de Emanuel Macron foi
essencialmente plim-plim: um ambiente tipo Projac, com uma câmera de grua buscando
sofregamente o melhor ângulo do seu
perfil gaulês. Todo o fundo do palco era constituído por um telão de altíssima
definição e as bancadas dos chefes de estado dispostas como num estúdio de de
TV. Decididamente Macron queria comunicar e a sua mensagem era de urgência:
“estamos perdendo a corrida para as mudanças climáticas! Esse é o desafio de
nossa geração: ganhar a batalha contra o tempo!”.
O afã de
ocupar o espaço vazio de Barack Obama, acintosamente abandonado por Donald
Trump, se evidenciou pelo papel
oferecido aos personagens insurgentes do que chamo de U(d)SA: United
(decarbonizing) States of America: o governador e o ex-governador da
Califórnia, Jerry Brown e Arnold Schwarzenneger, o ex-secretário de estado John
Kerry, o financista e ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg, o fundador da
Microsoft Bill Gates, o governador do Colorado John Hickenlooper, o ator Sean Penn e outros.
No mesmo dia em que Trump perdeu a eleição para o Senado no ultra conservador
Alabama, viu também os U(d)SA
pontificando em Paris.
O One Planet ficou algo aquém da pretenção
anunciada de uma “cúpula de chefes de estado”: a China trouxe o vice-primeiro
ministro, Liu Yandong – para além do seu indefectível “Mr. Clima”, Xie Zhenhua--
, a India, Brasil, Canadá e Alemanha se
fizeram representar por ministros. A ausência mais notada foi a da chanceler
Angela Merkel, a grande parceira política de Macron na Europa, às voltas com uma difícil negociação para
formar maioria parlamentar e governo mas que, segundo as más línguas, não quis
botar essa azeitona na empada do borbulhante Marcron. Mandou a ministra do meio
ambiente Barbara Hendricks. Macron fez questão de dividir a presidência com o
secretário geral da ONU, Antônio Guterres e o presidente do Banco Mundial Jim
Yong Kim, sóbrios e circunspectos. Os
chefes de estado mais em voga, para além os dos países nórdicos e africanos,
foram o presidente Peña Nieto, do México --o grande papagaio-de-pirata do
evento-- e o rei do Marrocos, Mohammed VI.
One Planet esteve mais um grande talk show climático do que uma cimeira de chefes de estado mas
funcionou e pode ter consagrado um formato onde governantes, iniciativa privada
e personalidades midiáticas se juntam e misturam. Algo evidentemente
complementar ao processo de negociação climática da UNFCCC mas que procura
avançar naquele tema fundamental no qual esta empaca: a finança da
descarbonização. Como juntar os 3.5 a 5
de dólares trilhões/ano de investimentos necessários para descarbonizar as
economias e atingir o net zero, na
segunda parte do século, eludindo as
consequências mais catastróficas?
Não se
pode dizer que o One Planet tenha
aportado as grandes respostas a essa pergunta mas acrescentou alguns elementos
interessantes. O Banco Mundial anunciou que iria precificar o carbono a 40
dólares em suas operações a tonelada. Foi anunciada –sem nenhum detalhe— uma
articulação entre bancos de desenvolvimento e outra entre fundos soberanos para
financiar a descarbonização, segundo, tudo indica, garantias para a atração de
grandes investimentos do setor financeiro internacional propiciando juros
baixos. Foram reforçadas certas articulações e compromissos já em curso como o
compromisso de abandono do carvão e a aliança solar. Oito estados norte
americanos firmaram uma aliança pela eletrificação automotiva. A China e o
México anunciaram –algo requentadamente--
seus mercados nacionais de carbono com articulação
sub-nacional/internacional. A adaptação, frequentemente deixada para um segundo
plano, mereceu um destaque interessante, no One
Planet, com dois painéis dedicados a
ela e anúncios de financiamento com cifras explícitas para países da África e
do Caribe.
Noutros tópicos, houve um recuo de última hora, como na articulação para
uma espécie de fundo garantidor público internacional para viabilizar financiamento
para programas e projetos ao juro mais baixo disponível. O recuo temporário se
deveu a necessidade de “combinar com os alemães” e a dúvidas sobre como isso
poderia ser estruturado “sem criar uma nova burocracia”. Isso também prejudicou
os avanços pretendidos em relação à precificação positiva: mecanismos de
premiação da descarbonização. Esses temas deverão ser retomados em breve. Em
quase todas as intervenções que trataram da questão do financiamento prevaleceu
o raciocínio de que a forma de atrair os trilhões necessários se dará através
de uma articulação de garantias públicas com recursos provenientes do setor
financeiro global, onde está a maior reserva de
dinheiro do mundo. O consenso esboçado envolve a necessidade de oferecer
garantias dos governos, fundos soberanos e bancos de desenvolvimento e de se
ampliar muito a capacidade de elaboração de bons projetos, hoje muito
deficiente. Mas essas foram conversas mais de bastidores que não couberam no
formato televisivo do evento.
Não
sabemos ainda qual foi “efeito público interno” do One Planet, certamente uma preocupação central de Macron que luta
para subir nas pesquisas de avaliação que andaram se deteriorando recentemente.
Seu efeito político global, no entanto, parece positivo por ter trazido para um
protagonismo conjunto governos nacionais, sub nacionais, iniciativa privada,
personalidades midiáticas; por ter
afirmado o tema adaptação e por ter ingressado –embora sem grandes avanços—no
tema da mobilização dos trilhões. Como diriam os italianos (cujo primeiro
ministro Paolo Gentiloni, aliás, também não compareceu): La nave và.
Projac climático |
Multifrisson |
Macron no seu habitat |
Ó Mô Deusi...Que fotografia linda você olhando para Terra Azul...
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