A
eleição de Donald Trump caiu como uma bomba na COP 22, em Marrakech. Afinal,
ele declarou que a mudança climática “é uma fraude inventada pelos chineses” e
rodeou-se de negacionistas climáticos. Num dos debates com Hillary, no entanto,
negou seu negacionismo com grunhidos e caretas sem explicar exatamente qual sua
posição. Ele certamente irá tentar favorecer a indústria do carvão que
atualmente passa por uma crise provocada, em parte por uma regulação climática
e ambiental mais severa, mas numa medida
maior ainda por uma razão econômica: o boom
do gás de xisto, barato e altamente competitivo com o carvão. Ao contrário
de muitos republicanos Trump já adotou no tempo diversas posições opostas entre
si sobre diversos assuntos. Não é evidente, embora certamente possível, que
adote uma posição radicalmente negacionista. Prevejo mais ambiguidade e
confusão.
A energia limpa, as eólicas e o solar hoje
constituem uma grande força econômica geradora de emprego e negócios, inclusive
no sul dos EUA em estados governados pelos republicanos, como o Texas. Trump,
mesmo que queira, não conseguirá reverter essa tendência nem os estímulos às
energias limpas que vigem até 2020. Claro, poderá fazer bastante estrago no
arcabouço político-diplomático arduamente construído e sacramentado do Acordo
de Paris mas mesmo para se retirar do Acordo ele terá que percorrer tortuosas
vias. Mais fácil será fazer corpo mole. Boicotar o que já era difícil.
Até
agora a única coisa que se pode dizer com certeza é que daqui para frente uma
estratégia climática global poderá avançar menos pela via regulamentadora,
consensual, como é esse processo da UNFCCC. Ela precisará se impor, por
si, como uma tendência da economia
moderna. A transição para a descarbonização será pela via econômica ou não
será.
O estande dos EUA fica quase em frente ao do
Brasil e notam-se aqui muitos membros de sua delegação desolados. O secretário
de estado John Kerry, no entanto, manteve sua visita a Marrakech e irá marcar
fortemente posição de apoio ao Acordo de Paris. Já será de certa forma um dos
primeiros atos de resistência aos tempos obscuros que em breve virão.
Minha
filha que mora em Los Angeles me ligou aos prantos, meus amigos do Climate
Reality, de Al Gore, estão
desconsolados. A guisa de consolo tenho lhes dito o seguinte: era inevitável
depois de oito anos de um --extraordinário-- presidente negro que a sociedade
norte-americana acabasse engendrando, por conta dos desajustes da globalização
e resistências ao multiculturalismo, um
ciclo reacionário. Hillary teria tido dificuldades enormes para governar. Se
esse ciclo abriu-se mais cedo um otimista poderá imaginar que também terminará
mais cedo. Vai depender da força da metade da sociedade norte-americana (que
ganhou por pequena vantagem o voto popular) e de sua vontade de retomar o
caminho de Obama. A própria presidência de Trump tenderá a ser uma montanha
russa (ou uma roleta russa) de desatinos com cenários nesse momento
inimagináveis e possivelmente tragicômicos.
Quanto à
COP 22, em si, ela não está dentre aquelas destinadas a ser politicamente
importantes. Trata-se aqui de esmiuçar e iniciar a aplicação de aspectos do Acordo de Paris e os prazos
para tanto numa conjuntura atropelada –aqui no bom sentido-- pela
sua surpreendentemente rápida ratificação
e entrada em vigor. Em foco estão
questões como a da transparência
e da comparabilidade entre os Compromissos Nacionalmente Determinados dos
diversos países e a possibilidade de todos expressarem quais serão suas
reduções (ou não) de emissões no agregado; o financiamento da adaptação e do
Fundo Verde do Clima; as “regras de aplicação” das diversas previsões do Acordo;
o conteúdo específico da COP 24, prevista para 2018, e que deverá se debruçar sobre estratégias de
longo prazo para economias carbono neutras,
na segunda metade do século são algumas das questões relevantes em
discussão.
Como
dirão nossos anfitriões: “os cães ladram, a caravana passa”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário