03/07/2016

Clima: resta uma pequena janela de oportunidade

O observatório de Mauna Loa no Pacífico detectou esse ano um record de concentração de galeses efeito estufa na atmosfera: 407 ppm. No início da era industrial eram 280 ppm  e o limite estabelecido pelos cientistas para termos  uma chance de permanecer abaixo dos 2 graus de aumento da temperatura média, esse século, é de 450 ppm. 

Estamos chagando lá, rapidamente.   Recente estudo feito sob a égide do Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas, o IPCC, publicado na revista Nature,  atualizou as correlações entre volumes de emissões de gases efeito estufa (GEE) e aumentos de temperatura média do planeta, até o final do século. Num cenário de inércia absoluta,  ao gosto dos negacionistas climáticos,  o aumento seria de entre 4.1 e 5.6 graus. Num cenário de mera continuidade das políticas atuais, teríamos entre 3,2 e 4.4 graus. Numa projeção de rigoroso e incondicional cumprimento dos compromissos voluntários assumidos,  ano passado,  com vistas ao Acordo de Paris, os chamados INDC,  ficaríamos entre 2,9 e 3,8 graus. 

 Hoje assistimos às consequências do aumento de pouco menos de um grau já registrado desde o início da era industrial: derretimento acelerado de geleiras; enchentes,   furacões e secas mais frequentes e intensas;  impactos devastadores sobre a agricultura – como a estiagem de quatro anos que precedeu a guerra civil Síria--   elevação do nível dos oceanos; migração de epidemias, etc. Agora imaginemos um futuro, ainda no período de vida de nossos filhos e netos,   com esses cenários apresentados na Nature. A simples progressão aritmética é francamente assustadora mesmo sem incorporar riscos exponenciais, retro-alimentadores ainda mal estudados: a liberação massiva do metano do Artico, do permafrost siberiano e do fundo dos oceanos e a  redução da capacidade de absorção de CO2 provocada pela acidificação dois mesmos e pelo deterioro das florestas tropicais.

   O estudo também permite vislumbrar uma estreita janela de oportunidade de aproximadamente 15 anos: um  processo de revisões quinquenais dos INDC pelo qual ainda seria possível conter o aumento da temperatura média do planeta abaixo dos 2 graus que para os cientistas separa as consequências  graves das simplesmente catastróficas.  

 Permanecer  abaixo dos 2 graus depende  do advento de uma economia global carbono neutra, por volta de 2075,  na qual o emitido e o retirado da atmosfera se equivalham. Isso pressupõe, entre outras coisas, o abandono do carvão em um prazo relativamente curto e do do petróleo mais adiante. Demandará energias limpas e renováveis com grande otimização de sua eficiência; a eletrificação dos transportes ou sua “hibridização” com uso de biocombustíveis;  técnica massivas de captura e sequestro de carbono;  desmatamento zero,  gigantescos projetos de reflorestamento e uma agricultura e uma pecuária de alta produtividade e baixo carbono. Trata-se de uma verdadeira revolução tecnológica e cultural que precisará de investimentos gigantescos.  Por outro lado,  ela deve aportar implicações globais econômicas e sociais bastante positivas.


  Há uma convergência de caminhos entre a transição para economias de baixo carbono e uma superação da chamada “financeirização” que, segundo recente matéria de capa da conservadora revista Time, está  estagnando a economia global  A transição para economias de baixo carbono pressupõe investimentos de aproximadamente 3 trilhões de dólares, por ano, algo muito além dos 100 bi em torno dos quais tanto se polemiza nas Conferências do Clima da UNFCCC. Os governos, praticamente todos com déficits e forte endividamento, não conseguem aportar esses trilhões embora possam mobilizar garantias e criar instrumentos de pressão para eventualmente drenar uma parte dos 220 trilhões  que hoje  circulam no sistema financeiro global. Um esforço envolvendo um grupo pioneiro de governos, bancos centrais, bancos de investimento e agencias multilaterais, sob a égide do G 20, numa espécie de “ Bretton Woods do baixo carbono”, poderá consagrar novos mecanismos correspondendo a essa necessidade histórica premente da humanidade. 

 Nos âmbitos nacionais torna-se urgente a taxação do carbono cujo efeito será incorporar ao preço produtos e serviços carbono intensivos suas “externalidades”, ou seja, os custos reais de  danos sociais e econômicos, hoje escamoteados. Essa taxação deve ser instituída suprimindo outros tributos sobre trabalho e investimento.  É preciso também redirecionar quase um trilhão de meio de subsídios a combustíveis fósseis. 

 Outra ferramenta é a chamada “precificação positiva”, baseada no parágrafo 108 da Decisão de Paris a qual reconhece o valor social e econômico da redução/remoção de carbono. Ela permitirá aportar liquidez às economias produtivas de baixo carbono via “certificados de redução/remoção de emissões”, uma espécie “moeda do clima” dos tempos da catástrofe que ainda pode ser mitigada.

Um comentário:

  1. Um aumento de quatro a cinco graus na temperatura média do planeta ,a partir do 0 provocaria uma alteração de quantos graus centígrados?

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