De qualquer forma eu fiz a observação sob uma
ótica otimista, como é do meu –tantas vezes ingênuo-- feitio. Imaginei a Dilma
agarrando a oportunidade de fazer
história: colocando o Brasil na liderança de um processo no qual tem uma grande
vantagem competitiva. O Brasil é, de fato, objetivamente e inequivocamente, o país que mais reduziu suas
emissões de gases efeito estufa, desde 1990.
Nosso “pico” foi em 1995: 2,6 gigatoneladas (bilhões de toneladas de CO2
equivalente) ou Gt e tivemos um repique em 2004, em 2,4 Gt. Como
nosso desmatamento baixou de 27 mil km2
em 2004 para menos de cinco mil, atualmente estamos emitindo algo próximo de
1.3 Gt.
Até final de setembro, teremos que determinar nosso INDC, nossa meta de referencia de redução de
emissões para a Conferência de Paris. A primeira questão, antes de discutirmos o
quanto é determinar a natureza dessa meta. Há nas instâncias governamentais que
tratam do assunto com alguma consistência técnica, na sociedade civil, nos meios acadêmicos um consenso inicial,
elementar: a meta brasileira não pode mais cair na desonestidade intelectual do
chamado “desvio da curva business as usual BAU” ou seja chutar para cima um
nível de emissões, em 2030, e depois chutar
um percentual de redução em cima desse número imaginário frequentemente
associado a projeções de crescimento do PIB simplesmente escalafobéticas como
foram as de 6% a 4%, em Copenhagen, em 2009.
Atualmente vista a urgência cada vez maior com que o problema é encarado,
em todo o mundo, simplesmente pega mal fazê-lo, virou um ‘mico’ mexicano.
As áreas do governo afeitas ao tema vem
discutindo-o internamente e com lideranças e especialistas da sociedade civil.
Prudentes que são, concordaram em avançar apenas esse pequeno passo na
declaração conjunta Brasil – China quando da visita do primeiro ministro Li
Kequiang. Lá estava uma pequena frase que para a maioria das pessoas soa sem
muito sentido mas para os entendidos subentende que o Brasil fixaria sua meta “no
agregado”, ou seja em limites absolutos de emissão, em gigatoneladas de carbono
equivalente. Era simplesmente " Brazil has announced its intention to establish an upper limit to its emissions by 2030."
(O Brasil anunciou sua intenção de estabelecer um limite máximo para suas emissões em 2030) Os mesmos setores do governo queriam avançar num ambicioso pacote de energia solar com os chineses. Uma declaração em 15 pontos, em separado, com vários passos concretos. Um negócio ambicioso. O problema que ninguém conseguia conversar com a presidenta sobre esses temas fazia muito tempo. Ou seja não combinaram o jogo com os russos...
Voltemos a minha assertiva inicial. As
mudanças climáticas são uma das poucas áreas importantes que em que Dilma ainda
tem o poder de fazer a diferença. Imaginei isso para o bem. Vislumbrei-a “ocupando
o espaço” e colocando o Brasil na
liderança do processo: fixando um objetivo de longo prazo, a neutralização das
emissões em 2050 e fixando nossa meta para 2030 algo abaixo das nossas emissões
de 1990. Há um estudo que o governo tem em mãos colocando um cenário (atrasado)
de 1.6 Gt e dois mais avançados de 1,2 e ligeiramente abaixo de 1 Gt. Na
Comissão Mista de Mudanças Climáticas do Congresso Nacional, que presidi ano
passado e cujo relator era um senador ruralista, nos entendemos em torno de uma redução de 15%
em relação a 1990, mais ou menos 1,2 Gt. Pessoalmente defendo o 30% em 2030,
que na prática daria perto de 1Gt. O que não é concebível é chegarmos em 2030
com emissões superiores as atuais(1,3Gt)
ou superiores às de 1990 (1,6 Gt).
O que não percebi, inicialmente, é que aquela minha
avaliação sobre a presidenta poderia estar certa em relação ao poder que ela ainda
tem nessa área mas minhas expectativas podiam estar totalmente equivocadas. Ou
seja, ela poderia, sim, ainda utilizar
esse poder que ainda lhe resta nesse campo mas não para colocar o Brasil na vanguarda do
processo climático mas dar vasão às suas idiossincrasias. É que Dilma é idiossincraticamente hostil às
energias limpas e, por tabela, sensível ao discursos mais retrógrados em
relação ao clima que podem ser encontrados no MME do Lobão –mudou o ministro,
para melhor, mas a turma do Lobão continua por lá-- ou em outras áreas reacionárias do sistema
fóssil-energético. Mas, a rigor, ela nem precisa deles. Tem suas próprias convicções,
não é?
Resumo da ópera: a presidente mandou eliminar
a tal frase e enterrar a grande iniciativa solar com os chineses. Digamos que que o fez com a ênfase que lhe é peculiar...
Em relação à frase aconteceu um acidente: chegou a circular uma versão do
documento com ela. Enquanto sua interpretação ainda era discutida ela simplesmente
sumiu nos sites oficiais. Já o solar-que-virou-suco, por pressão dos chineses,
voltou à vida não mais num documento parrudo, à parte, mas no corpo da declaração conjunta, de forma
anódina mas mal que bem consagrando um investimento significativo que parece
que vai acabar saindo numa fábrica montadora de painéis solares.
O processo em relação a COP 21 em Paris está
apenas se iniciando e o INDC, a não ser que decidam um improviso “nas coxas”
deve sair lá para setembro. Ou seja há ainda um certo tempo para mobilizar a
sociedade e também para tentar convencer a presidente da república. Pelos
vistos uma missão para Papa Francisco. Aguarda-se um milagre...
Nenhum comentário:
Postar um comentário