12/04/2014

Rumo à "moeda do clima"

Venho focando na idéia de que é fundamental criar um lano de fundo favorável à economia de baixo carbono. Atualmente toda dinâmica de funcionamento dos sistemas tributários e toda a lógica de funcionamento do sistema financeiro internacional é desfavorável, ou, na melhor das hipóteses, neutra em relação à crise climática.

Eis uma proposta que tenho apresentado em diferentes foros de discussão climática dos quais participei recentemente no Itamaraty e na SAE(Secretaria de Asssuntos Estratégicos da Presidência da República:


Mecanismo de ação antecipada & adicional, “moeda do clima” e “Bretton Woods do baixo carbono”.



A apresentação (submission)  brasileira à UNFCCC,  na Conferência de Varsóvia,  relativa à chamada early action (ação antecipada)  na redução de emissões de GEE,  antecipando metas para antes de 2020,  é uma iniciativa promissora do Itamaraty. Nossa proposta aqui é aperfeiçoa-la ampliando sua abrangência tornando-a catalizadora de uma nova ordem financeira internacional lastreada em uma “moeda de baixo carbono”.

 Nossa proposta inclui:

1 – O reconhecimento, certificação e a ‘precificação’ de ações antecipadas (early actions)  e  de ações adicionais(aditional action).

As primeiras referem-se ao período 2010-2020 e registram ações de redução de emissões GEE para além das metas do segundo período do Protocolo de Kyoto, para os países desenvolvidos,  e dos NAMAs de Copenhagen para os demais. As segundas são ações para além das metas estabelecidas em 2015 para o pós 2020.

 Ao invés da formulação original da apresentação :  a contabilização das ações antecipadas para o cumprimento de metas pos-2020, propomos algo mais ambicioso:  sua remuneração com nova unidade de valor internacional, uma “moeda do clima” MdC.  

2 – As ações antecipadas e adicionais serão remuneradas em MdC que servirá, inicialmente,  para adquirir serviços, produtos e tecnologia que produzam reduções de GEE subsequentes estabelecendo-se assim um ciclo virtuoso. O poder de compra e sua conversibilidade da MdC tornar-se-á mais abrangente na medida em que vá se consagrando no âmbito do sistema financeiro. A remuneração em MdC  se iniciará por um pequeno bônus inicial pelo o cumprimento da meta ou NAMA com uma precificação em curva ascendente do volume de redução de GEE “antecipad”o ou “adicional”.  A conversibilidade do MdC em relação a outros produtos, serviços, tecnologia e as próprias moedas se ampliar-se-a com o tempo sempre na lógica de indução de reduções de emissão subsequentes.

3 – O ente emissor/gestor da MdC será  o Mecanismo de Ação Antecipada e Adicional (MAAA) com seu Fundo de Ação Antecipada e Adicional (FAAA) devidamente legitimado no processo UNFCCC. Funcionaria com o aporte financeiro de governos, enquanto garantidores de última instância, atraindo, a partir daí,  recursos do sistema financeiro internacional, instituições multilaterais e setor privado. O “fundo garantidor” será formado  por governos na proporção das emissões históricas ou de um critério combinando estas, as  emissões per capita e as estimativas futuras de emissão numa proporção a ser negociada no âmbito da UNFCCC. Uma das missões primordiais desse fundo garantidor seria o de propiciar um rating AAA para capacitar o mecanismo a atrair fluxos do sistema financeiro internacional levando este a reconhecer a redução de carbono como uma nova unidade/referência de valor.

4 -  O MAAA listaria uma relação de serviços, produtos e tecnologias certificadas como promotores de redução de emissões que poderiam ser pagos em MdC . Isso  além gerar reduções subsequentes, contabilizáveis,  terá  efeitos econômicos e sociais, colaterais,  amplamente benéficos. O MAAA não substitui do MDL mas tende a suplanta-lo,  no futuro,  como um mecanismo muito mais eficaz e justo. No MDL a redução certificada é  adquirida para compensar o não cumprimento de metas de redução por uma outra parte. Aqui a redução é remunerada de forma a gerar mais redução subsequente  e efeitos sócio-econômicos benéficos com geração de emprego e renda e promoção de energias e tecnologias limpas.  

 Isso representa um passo importante rumo a uma nova ordem financeira internacional de baixo carbono.  O sistema lastreado pela MdC poderá expandir seu alcance  na medida em que vá atraindo recursos do sistema financeiro internacional cuja disponibilidade é atualmente muito superior àquela dos governos e na medida em que a redução de emissões de GEE puder ser reconhecida como uma unidade de valor do sistema financeiro internacional. Esse tipo de reconhecimento dependerá de uma nova concertação do tipo  “Bretton Woods do baixo carbono”, envolvendo partes governamentais, multilaterais e iniciativa privada  no contexto multipolar do século XXI. Articulações para além da UNFCCC se farão necessárias para tanto.

5 – Um desdobramento do alcance inicial do MAAA é poder remunerar no futuro por ações antecipadas ou adicionais também governos regionais e locais, o setor privado e o terceiro setor,  desde que baseando-se em metas certificadas, evitada a possibilidade de “dupla computação”. Isso exigirá um aperfeiçoamento bem maior da regulação na governança climática internacional a esse respeito. O pleno potencial desse mecanismo, no entanto, só será alcançado com essa possiblidade de envolver governos sub-nacionais, empresas e terceiro setor.

 O Brasil deve tomar a iniciativa de suscitar esse debate  nos fóruns preparatórios para a Conferencia COP 20, em Lima no contexto do Stream 2 e, eventualmente, em outras instâncias como, por exemplo,  o G 20, a OMC e  o Banco Mundial no que couber.




Um comentário:

  1. Valorizar e também restringir através da moeda levando os países que emitem carbono em maior quantidade é genial Helenice Rocha

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