Foi um uma reviravolta histórica digna de um
roteiro de um thriller dos bons com
final totalmente inesperado. Um ato político insólito e inédito pela
sua ousadia e desprendimento, algo completamente fora dos cânones da política
brasileira marcada pelo extremo individualismo e egocentrismo recorrente. No
plano internacional também não consigo encontrar similares.
Aparentemente
incompreensível: como uma candidata que chegou a 26% tendo alternativas para
viabilizar sua postulação, ainda que complicadas, difíceis, opta por apoiar outro com um patamar de 7%?
Marina teve a coragem de fazê-lo e seu ato foi
de estadista: analisou o que o Brasil precisava, fez uma lúcida e desassombrada
análise das circunstâncias e desdobramentos e deu uma volta por cima
desconcertante que ninguém seria capaz de prever.
Ela poderia ter facilmente encontrado um
partido para lhe “dar legenda” e se candidatar a presidente. Teria um partido
tradicional, sério, como o PPS. Passaria a campanha tendo que explicar porque
dez dos seus doze deputados haviam votado com os ruralistas na votação decisiva
do Código Florestal, inclusive um, ruralista, particularmente truculento, de
Rondônia. Se optasse como alguns sugeriam por um
partido da “sopa de letrinhas” invariavelmente se veria assombrada pelos esqueletos e mais
esqueletos pulando dos armários de cada um deles.
Eu, pessoalmente, estava disposto a conviver
com a primeira hipótese(PPS) mas me preocupava não só a sua performance ambiental
como o tom político mais geral: Marina e todos nós, em geral, podemos ser altamente
críticos dos rumos atuais do governo mas incorporamos boa parte do saldo de
2002 para cá. Somos críticos mas não oposição sistemática, como vem sendo o
PPS. Internamente à Rede haveria muito ranger de dentes.
Nada disso seria fatal, a priori, mas, certamente, um fardo. E a opção por algum
nanico lato senso, por sua vez, seria extremamente perigosa.
Outra alternativa era simplesmente ficar de
fora com Marina jogando um papel de abandeirada da sociedade civil podendo
fazer uma anticampanha programática com em algumas eleições dos anos 80 e 90
fizemos com as “listas verdes”. Isso, no entanto, nos remeteria a uma era mais antiga do
movimento ambientalista. Foi o que
Marina chamou de opção “Maria Teresa de Calcutá”.
Nenhuma dessas possibilidades era atraente.
Mas elas pareciam as únicas que restavam à Rede. Pessoalmente eu me dispunha,
já há bastante tempo, apoiar Eduardo Campos caso Marina não fosse candidata. Era notoriamente meu plano B. Mas sempre encarei isso como uma opção individual minha e de Sérgio Xavier,
algo absolutamente inviável de ser emplacado na Rede.
Fazer essa proposta para o coletivo, na noite
fatídica da decisão do TSE pareceria uma insensatez passível de
linchamento político --simbólico, entenda-se—além de representar uma
insensibilidade sem tamanho com nossa candidata. Ninguém teria coragem de propor um despautério desses,
a não ser... a própria Marina!
Ela já vinha cozinhando a coisa com seus
botões quando começou a falar em “plano C”, pouco antes de cairmos numa
discussão perfeitamente dispensável que começou com uma reclamação dela, de
efeito retardado, sobre uma afirmação
que eu fizera, uma hora antes e que lhe soara injusta sobre a Rede.
Fora uma
discrição da nossa heterogeneidade com uma alusão aos evangélicos que lhe pareceu ofensiva quando essa não havia sido absolutamente minha intenção --alias, sou dos quadros de esquerda laica um dos que
tem melhor diálogo com esse segmento,
por diversos motivos, inclusive familiares.
A reclamação dela acendeu meu pavio
--notoriamente curto-- numa hora de stress e cansaço acentuados. Não vou aqui falar mais sobre esse pequeno
incidente. O fato é que minha impaciência e irritação me levou a privar-me da
continuidade daquela discussão e, sobretudo, do final do novelo de lã que
Marina começava naquele momento a tecer, pacientemente, sem que ninguém o percebesse.
No
final do novelo havia um Deus-ex-machina: uma reviravolta no processo eleitoral
brasileiro de 2014.
Os “spin
doctors” do Planalto jamais o preveriam! Ao, nas suas próprias palavras, “derrubar o aviãozinho de Marina na pista de
decolagem” buliram com a lei das consequências inesperadas: potencializaram a
candidatura de Eduardo Campos que tem um potencial bastante evidente: uma
estrutura política nacional, uma articulação com prefeitos. Um histórico de esquerda inatacável.
E um legado de gestão: trata-se do
governador mais popular do país, reeleito com uma votação consagradora e aberto
a novas ideias, particularmente às de sustentabilidade.
Marina identificou aí alguém que se comportara
fraternamente com a Rede –para além daquela cordialidade política interessada-- alguém com quem pode se tentar um caminho de
aliança programática para aprumar os rumos de um país cuja governança entra em
pane. Uma aliança eventualmente plausível de ganhar e de governar.
Solitariamente ela encontrou e depois
conseguiu fazer valer ante quase todos
sonháticos de uma alternativa arriscada certamente mas menos problemática que
as anteriores. Quem sabe uma decisão que entrará para a história como
um gesto ousado, humilde e desprendido que surpreendeu e depois mudou o Brasil.
Sirkis, isto pulverizou as formingas, mas esperamos pelo batalhão de socorro para sanar o formigueiro
ResponderExcluirQue bom quando as pessoas são fortes o suficiente para assumir suas posições por mais desastradas que sejam. A tua clareza, bom senso, honestidade e ética, só encontram precedentes na história da própria Marina. Faço votos para que estas qualidades contaminem toda a rede, seus apoiadores e transformem este país faz de conta, num país verdadeiro. Com certeza,após uma vida inteira de decepção política, vou afinal sair da apatia e fazer o meu impossível para que este país não leve outros quinhentos anos para sair do lamaçal.
ResponderExcluirMarina saiu na frente e já deu seu brado de Independência ou Morte,... agora cabe a cada um de nós dar o seu.
Bernardo Blum
Ela acertou. A REDE já é uma realidade. Como o próprio Lula teria dito a interlocutores: "foi uma direta no fígado" E eles, acusaram o golpe.
ResponderExcluirDiante desse intenso histórico, ó Sirkis, vejo que tenho que rever o frustrante sentimento que me restou das "Casas de Marina" e a ausência de ações objetivas para multiplicar a força dos 20% de Marina em 2010. Ainda estou meio destemperado para esse novo quadro, mas já me animo em procurar entender os que melhor entendem esse processo. Afinal, não há como negar que o Brasil precisa muito de subverter o modo de se fazer política!
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