06/10/2010

Marina no segundo turno




 É de praxe na política brasileira os candidatos derrotados no primeiro turno operarem rápida adesão a um dos remanescentes em gabinetes fechados, almoços ou telefonemas onde são barganhados ministérios, fatias de orçamento, secretarias, diretorias, superintencias e cargos comissionados. No jargão corrente são os tais “espaços políticos”. Esse não será o caminho dos verdes. Nossa primeira responsabilidade agora é fazer jus aos 20 milhões de votos (quase 20%)  obtidos por Marina Silva. Fique claro: não são votos verdes e nem mesmo Marina  pretende que sejam  “seus”. Conforme ela própria vem colocando insistentemente  são votos dos eleitores. De qualquer maneira  pairam sobre nós como uma enorme responsabilidade. Exigem que deles sejamos dignos. Não foram tanto votos  “de protesto” como de diferenciação e de esperança. Votaram em Marina a classe média iluminista, os jovens e as mulheres pobres, em grande parte cristãs. O voto verde veio incluído nos dois primeiros segmentos. O terceiro representa um poderoso vinculo de identificação pessoal com Marina. Um laço de amor.


 O segundo turno de fato exige uma definição. Dilma, Serra ou o não-envolvimento eleitoral. Isso será deliberado em aproximadamente  15 dias por uma convenção nacional do Partido Verde, prevista desde o ano passado, na qual garantir-se-á à posição minoritária o direito se ser expressa a título individual. Nossa responsabilidade imediata é criar canais de participação para segmentos que participaram intensamente da campanha  mas não pertencem aos verdes (grupo de programa, movimento Marina Silva e apoios religiosos) e, sobretudo, condensar um programa mínimo a ser apresentado e discutido de forma séria,  transparente e responsável com Dilma e Serra. 

  Vamos colocar a sustentabilidade socio-ambiental no cardápio das discussões com ambos empedernidos desenvolvimentistas clássicos. Mas abordaremos também outros aspectos: garantias de conduta republicana e respeito às instituições(traduzidas em providências práticas),   educação, segurança, saúde, etc. Será uma abordagem realista. Sem faca no pescoço, com direito à discussão aprofundada,  checagem de números e fatos. Mas que poderá demandar eventuais mudanças de rota e  colidir com outros compromissos já por eles assumidos. Marina, no segundo turno,  torna-se uma referência para os questionamentos da sociedade e um instrumento para a elevação de um debate que tende a virar  briga de torcida organizada na busca da vitória a qualquer preço. Queremos ajuda-los a evitar esse destino, até porque, conforme Marina colocou, caso vencesse, iria tentar um realinhamento histórico que juntasse o melhor desses dois partidos social-democratas que disputam entre si  a “liderança do atraso”.

O Brasil não pode deixar de discutir sobre  como direcionar seus investimentos públicos e seu sistema tributário para a sustentabilidade; sobre o que seria uma nova economia “verde” de baixo carbono, sobre as ameaças à legislação ambiental; sobre como a esfera federal poderia contribuir melhor para a segurança nos estados, como os terríveis gargalos na educação podem ser vencidos, como o saneamento básico e a prevenção de acidentes podem reduzir dramaticamente a pressão sobre nosso sistema público de saúde. De como podemos robustecer as boas práticas republicanas e as garantias individuais dos cidadãos e  de como, enfim, reformar um  sistema político gravemente enfermo. A ausência de Marina no segundo turno, por força da decisão soberana dos eleitores, transforma-se assim numa presença ética a programática.


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