Os preparativos para a Conferência de Paris, a COP 21, foram abalados
pelos horríveis atentados jihadistas que, possivelmente, se anteciparam à
entrada em vigor de suas medidas de segurança mais abrangentes, muito embora
seja muito difícil prevenir esse tipo de ataque indiscriminado. Não chega a ser
uma coincidência. A guerra civil da
Síria, com sua onda migratória, é um dos primeiros grandes conflitos
contemporâneos onde já se identifica com clareza uma influência das mudanças climáticas.
Foi precedida por cinco anos de uma terrível estiagem que levou ao colapso da
agricultura provocando forte migração para periferias urbanas de Damasco e
outras cidades. Lá, sob influência da “primavera árabe”, surgiram os protestos políticos,
afogados em sangue por Bachar el Assad, o
que desencadeou a guerra civil. Que
novas ondas migratórias, convulsões sociais, conflitos étnicos e outras guerras
civis influenciará, nas próximas décadas, o aquecimento global? Até agora
assistimos ao aquecimento médio de “apenas” um grau, desde o início da era
industrial. Por inércia ou insuficiência, seguimos para mais de 3 graus ao final do século. Segundo a ciência, na
melhor das hipóteses e graças a um esforço sem precedentes, ainda seria
possível conte-lo em 2 graus. Esse seria o limite para evitar consequências
catastróficas, diga-se de passagem, segundo cenários dentre os mais favoráveis.
A COP 21, pela natureza consensual de seu processo decisório envolvendo
195 governos que sempre tende a produzir
o mínimo denominador comum, produzirá avanços incrementais bem aquém do
necessário para os 2 graus. É importante, no entanto, que esse mínimo
denominador comum venha a ser o mais elevado possível. Depois, terá que haver um conjunto de
concertações complementares, bi e plurilaterais, dentre os sete ou oito maiores
emissores (China, EUA, EU, Índia, Rússia, Brasil, Japão e Indonésia) que
produzem quase 80% dos Gases Efeito Estufa(GEE) para ações de mitigação
subsequentes. No entanto, o mais importante é desatar o nó górdio de um
processo exponencial de transição para economias de baixo carbono que é a
ausência de financiamento na escala que se faz necessária diante do desafio climático.
Uma escala de trilhões.
Na última reunião preparatória para a COP 21, realizada em Bonn, no final
de outubro, foi incluída no rascunho do futuro acordo uma proposta brasileira
que reconhece “o valor social e econômico das ações de mitigação”, ou seja: a redução de carbono como uma unidade de
valor. 195 governos proclamam que reduzir
emissões de gases-estufa além de constituir valor social gera valor econômico. Por
quer isso é importante? Atualmente, o maior problema para enfrentar a crise
climática é como mobilizar de 3 a 5 trilhões de dólares, anuais, para grandes investimentos
em energia limpa, infraestrutura sustentável, reflorestamento e agricultura de
baixo carbono. Os governos, quase todos com déficits e forte endividamento, não
dispõem desses recursos. Não conseguiram, até agora, aportar mais de 10 bilhões
dos 100 prometidos ao Fundo Verde do Clima, até 2020. Os investimentos da iniciativa privada também
ficam muito aquém do necessário. Para enfrentar o desafio teremos que mobilizar
os trilhões. Onde estão?
Estão, obviamente, no sistema
financeiro internacional onde há um enorme excesso de poupança especulativa que
não flui em direção às economias produtivas podendo gerar “bolhas” do tipo 2008.
Existe uma crescente convicção de que os caminhos tanto para relançar a
economia mundial como para financiar a transição para economias de baixo
carbono são convergentes. Se no Brasil vivemos uma situação excepcional de
estagflação, resultante de erros crassos do governo, em boa parte do resto do
mundo, notadamente na Europa, a grande preocupação é com deflação + estagnação.
Para enfrenta-las o Banco Central Europeu vem operando o chamado quantitative easing, a oferta de
liquidez via aquisição pelo banco de variado tipo de produtos financeiros. O
BCE literalmente despeja dinheiro sobre a economia. Há uma crescente pressão
para que isso seja focado em papeis que financiem “ações de mitigação”, ou
seja, investimentos na redução de emissões que criem empregos e ajudem na inovação
tecnológica. A noção de que redução de carbono = valor, quando legitimada em
Paris, ensejará o lançamento de “certificados de redução de emissões”, que poderão
ser usados pelas empresas e governos para pagar parte do financiamento para
esses investimentos. Esses certificados deverão ter garantias que os governos,
apesar de seus recursos limitados, poderão prover, junto com as instituições
multilaterais, bancos centrais e de desenvolvimento, com isso reduzindo o risco
que inibe o setor financeiro de investir em ações de mitigação.
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