Ultimamente tenho participado de listas
de discussão onde se polemiza bastante sobre esses incidentes residuais que nos
sobram das manifestações de junho e dos quebra-quebra recorrentes promovidos
por grupos obscuros como o Black Block e outros anônimos que atuavam na franja
das mobilizações e que agora as substituem no espaço claramente desproporcional
que lhes concede a mídia.
Acho esse tipo de ação incompatível com os
propósitos de quem luta por um país e uma vida melhor. A violência é uma
espiral que sempre tem uma dinâmica dada. É como o gênio de Aladim uma vez fora
da garrafa....
A sociedade
brasileira atual é, em si, mais violenta do que a dos anos 60. Mata-se
muito mais, a quantidade de armamento --inclusive de guerra-- que circula na
sociedade é muito maior. O risco de degringolada –que sempre precisa ser
analisado-- parece ser menos de um novo
regime ditatorial do que de uma entropia do estado democrático pela perda total
de autoridade e pela instituição de uma espécie de novo medievalismo com
“poderes de fato” se sobrepondo localmente ao estado de direito. Em poucas
palavras a famosa síndrome dos estados falidos.
Por isso,
promover ou participar de situações de violência pode eventualmente
contribuir para derivações que hoje sequer imaginamos ou concebemos. Daí que
não posso concordar com a 'glamourização' mesmo de uma violência mais
"simbólica" como essa que pequenos grupos praticam no bojo de
manifestações e, agora , cada vez mais se transformam na manifestação em si.
Isso
nos coloca diante de uma questão clara: assumimos radicalmente a não-violência
como valor primordial? Ou de alguma forma flirtamos com a violência,
relativizamos , justificamos ou explicamos-a como
"consequencia" de um sistema injusto. Lançamos mão daquele
arsenal de racionalizações, mitos e fórmulas "heroicas" tão presentes
na cultura e mitologias da esquerda?
Quando vejo um certo
fascínio com grupos absolutamente minoritários --sem proposta alguma de
construção do que quer que seja para além do protesto-- gênero esse Black
Block, suscitam penso que essa é uma clarificação necessária.
Devemos ser condescendentes com movimentos
de contestação, que trabalham basicamente com energias negativas ou buscar de dentro da nossa altamente
imperfeita democracia construir algo melhor? Prioriza
absolutamente trabalhar com energias positivas?
Defendo a
não-violência ativa e a não participação, aprovação ou condescendência
com atos de violência, ainda que apenas simbólicos truculência policial e/ou
governamental. Aceito e posso
eventualmente participar de ações não-violentas de desobediência civil. São formas de luta democráticas e de
importância história em numerosas conquistas civis, sociais e ambientais em
todo o planeta.
A
escolha dessas formas de luta deve ser criteriosa, inteligente e organizada de
forma a coibir riscos de degeneração em violência. Deve, por outro lado, respeitar o máximo possível o direito de
terceiros, de cidadãos não participantes,
na sua vida cotidiana. Por isso devem ser evitadas ações que produzam
prejuízo, incômodo ou inconveniente sério à população no seu cotidiano.
Manifestações e outras ações que provoquem transtornos temporários devem ser
organizadas e realizadas de forma a minimiza-los dentro do razoável.
E preciso entender a
dinâmica da violência e bani-la de nossas ações desde o nascedouro. Devemos ter
tolerância zero com qualquer forma iniciativa violenta. Black Block e similares
são gangues infra-políticas que possuem a mesma dinâmica dos skinheads, grupos
punk agressivos, das torcidas de futebol briguentas, das “patotas” de briga da
minha adolescência. Podem se apropriar de fragmentos de um discurso político
mas seu impulso primordial é o gosto pela agressão física e pela
destruição. Insisto: tolerância zero com a violência em atos políticos.
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