Entrevista que dei hoje sobre reforma política:
- Que mudança seria necessária no sistema de votos no Brasil ?
O PV defende o voto proporcional em lista partidária como na Espanha ou em Portugal mas não há chance disso ser aprovado dada a atual correlação de forças. O viável e que representaria um avanço seria a adoção do voto distrital misto. 50% dos deputados e vereadores eleitos por uma lista partidária, o eleitor votaria na sigla do partido e os outros 50% eleitos de forma majoritária (na ordem simples dos mais votados) em todo o estado ou em 3 ou 4 grandes distritos em cada estado. Esse sistema simultaneamente fortalece os partidos (e os torna mais responsáveis e mais vulneráveis à sanção do eleitor) e fortalece a quem tem voto individual. Desfavorece o chamado "baixo clero" da política. É o que vejo como avanço viável nessa conjuntura.
- Sobre o financiamento público de campanha, o PV e sua liderança defendem o tema na comissão?
O financiamento público só é viável para os partidos, não é para os candidatos individualmente. Isso parece induzir a conclusão que no sistema que estou propondo como consenso haveria financiamento público par as listas e manter-se ia o sistema atual para as candidaturas individuais, com um detalhe: o estabelecimento de um limite máximo de doação que um candidato possa receber.
- O sistema proporcional de votos (modelo aplicado hoje) influencia em algum tipo de resultado prejudicial ao sistema democrático?
O sistema proporcional personalizado só existe no Brasil por isso já o apelidei de voto jabuticaba. É o pai e a mãe do fisiologismo brasileiro. É indutor de uma cultura política onde a carreira do político individual é a base de toda vida política. Os partidos são meras legendas para reunir aritmeticamente cocientes eleitorais, precisam recrutar gente que aporte votos independente do seu posicionamento ideológico. Não tem coesão nem solidariedade partidária, o maior adversário de um político é seu colega de partido.
Uma vez eleito o político luta para garantir a reeleição: vem a ocupação para uso eleitoreiro da máquina pública, os cargos comissionados em profusão, os famosos centros assistenciais (moderno curralismo), a compra de voto. Os governos são instáveis dependentes de barganha fisiológica. Os partidos buscam personagens folclóricos, do mundo do espetáculo, do futebol, etc... para "puxar legenda" e acabam elegendo, na sobra, gente sem nenhuma representatividade. Participo de eleições desde 1988 e a cada uma vejo encolher o chamado "voto de opinião" e aumentar a representação dos que manipulam centros assistenciais, compram voto ou a de personagens folclóricos.
Proposta que fiz de agenda para a Comissão Especial da Reforma Política:
Conforme coloquei na primeira reunião da Comissão entendo que o primeiro ponto a ser discutido é o sistema eleitoral. Outros temas como: financiamento de campanha, propaganda eleitoral, prazos, fidelidade partidária, cláusulas de desempenho, suplências, "janela" para troca de partido, são desdobramentos apenas possíveis uma vez esteja definido o sistema eleitoral.
Por isso penso que a melhor forma de desenvolver os trabalhos seria:
1 - Discussão genérica em torno do sistema eleitoral para verificar por onde pode passar um amplo consenso (sem ele não haverá reforma).
Percebo que nem o voto por lista fechada, nem o voto distrital, nem o "distritão" são capazes de atingir esse amplo consenso como exclusivos. Intuo que a única forma de se chegar lá seria uma modalidade de voto distrital misto com 50% eleitos pelo componente proporcional e 50% pelo distrital-majoritário. Essa deveria ser a primeira tentativa de consenso. Verificar se genericamente uma expressiva maioria concorda com isso. Também com a adoção do princípio da simplicidade: mecanismos complicados que dificultem o eleitor na hora de votar ou que não se ajustem ao sistema de votação informatizado que temos não devem ser considerados.
2 - Discussão sobre qual a modalidade do componente distrital.
2.1 - Há três possibilidades para o componente distrital:
2.1.1 - "Distritão" - o estado como distrito eleitoral com a escolha majoritária.
2.1.2 - "Grandes distritos" - A divisão do estado em poucos (3 ou 4) grandes distritos, com a possibilidade de vários candidatos por partido em cada.
2.1.2 - Distrital uninominal "clássico" - Estado dividido em um número de distritos eleitorais igual ao das cadeiras em disputa nos parlamentos e em cada um deles os partidos apresentam um único candidato. A princípio esse voto distrital clássico aparece mais complicado pela necessidade de se desenhar não só os distritos que em todo o país correspondam aos 513 deputados federais --esse desenho nunca é politicamente neutro-- como também redesenha-los para as eleições de deputados estaduais e vereadores. A eleição para deputados federais e estaduais coincide no tempo mas os distritos não coincidirão no espaço. No Rio de Janeiro, por exemplo, teria que haver 46 distritos para eleição de deputados federais e 70 para estaduais.
2.1.3 - Definição do prazo de aplicação da reforma: pessoalmente penso que devemos tentar um reforma suficientemente simples e rápida que possa valer para as eleições municipais de 2012.
Resumo da ópera: parece mais fácil criar o consenso em torno do Distritão ou dos Grandes distritos. Os Grandes distritos talvez atendam melhor às peculiaridades regionais em cada estado. O Distritão tem o mérito da simplicidade.
2.2 - No componente proporcional seria por lista na medida em que parece haver consenso que o sistema proporcional atual não serve mais é seria mais difícil combina-lo com o distrital. Em relação ao componente proporcional, deveria discutir-se, mais à frente, como seria composta a lista que exigências mínimas caberia fazer aos partidos em termos de democracia e transparência. Também poderia haver discussões sobre clausula de desempenho, modalidade de propaganda, financiamento, prazos, fidelidade etc..
3 - Atingido um consenso, detalhar-se-ia, ainda no âmbito do sistema eleitoral, propriamente dito, alguns critérios como:
3.1 - quantos candidatos cada partido poderia apresentar na lista, no "distritão" e nos "grandes distritos"?
3.2 - os candidatos na lista poderiam também participar do componente distrital-majoritário? Todos? Todos menos do "cabeça de lista"?
3.3 - haveria clausula de desempenho no componente proporcional? Pessoalmente, acho que deveria situar-se em 3% dos votos válidos em cada estado. O partido ficaria sem representação apenas no estado que ficasse abaixo disso;
3.4 - como seriam repartidas as "sobras" no componente lista: proporcional aos votos de cada partido ou iriam para o partido mais votado de forma análoga ao chamado "diferencial de Hondt" vigente, por exemplo, na Espanha?
4 - Estabelecido o sistema eleitoral, aí sim, caberia tratar das decorrências:
4.1 - Financiamento de campanha
4.1.1 - público para o componente proporcional e , caso fosse essa a modalidade escolhida, nos distritos uninominais? (O financiamento público não é viável para candidaturas individuais a não na situação de uma por distrito, como representação única do partido.) ?
4.1.2 - manter o financiamento de pessoa física e jurídica (apenas empresas? permitir sindicatos e ONG?) para as candidaturas individuais no caso do distritão ou grandes distritos, estipulando um limite máximo?
4.2 - Processo de escolha de candidatos proporcionais e majoritários?
4.2.1 - Convenções e eleições primárias, democracia interna. Haveria diferenças de direitos e deveres entre candidatos de lista candidatos distritais-majoritários?
4. 3 - Propaganda: como seria dividido o tempo de TV entre o componente proporcional e o distrital?
4. 4 - Prazos: manutenção dos atuais para filiação e domicílio eleitoral?
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