Seu micro coraçãozinho parou de bater quando você não tinha mais que nove milímetros e nove semanas. Ignoramos a razão. Não sabíamos ainda se você seria menino ou menina. Já lhe projetávamos todo nosso amor. O amor pelos fílhos é mais intenso e o que flui mais fácil. Se você tivesse se desenvolvido para ser pessoa e nascido em junho ou julho de 2011 seria uma criatura privilegiado pelo amor e conforto de uma família de gente querida, num cidade bonita, com grandes problemas de um mundo preocupante.
Quando você chegasse aos 40 anos compartilharia o planeta com nove bilhões de pessoas e riscos exponenciais em relação aos dias de hoje em termos de aquecimento global, danos à biodiversidade e proliferação nuclear. Apesar do meu incorrigível otimismo do coração não consigo, com base nos dados que disponho hoje, escapar da idéia de que na época que você chegasse a 80 e tivesse netos, estaria num planeta com um aquecimento, muito além dos dois graus que os cientistas hoje consideram aquele máximo tolerável para conseqüências ainda “controláveis”.
Como ficaria o Rio, o resto do litoral brasileiro, as outras grandes cidades, o Nordeste, a Amazônia? O Brasil como um todo, com sua tendência a aquecer 20% mais que a média do planeta? E noutras regiões do mundo, onde hoje já existe tão pouca água ou naquelas em que o mar está submergindo áreas d’antes habitadas, nas ilhas que devem desaparecer, nas culturas agrícolas, notadamente de alimentos, que perigam desaparecer. O que seria das geleiras do Ártico que retem grandes reservatórios de metano 21 vezes mais ativo, como gás de efeito estufa que o CO2, ou das neves do Himalaia e dos Andes que abastecem de água bilhões de pessoas? Ainda existiriam as neves do Kilimanjaro quando você estivesse em idade de ler livros de geografia para seus filhos?
Você seria chamado a ingressar, com pensávamos no final dos 70, na Era de Aquárius, ou destinado a viver em alguma réplica pós-moderna da era medieval, com uma infinidade de forças centrífugas (fundamentalismos religiosos, criminalidade globalizada e guerras locais), promovendo destruição localizada mas, numa escala inimaginável. Seria ameaçado pelo terrorismo nuclear? Veria novos bárbaros dos cantos jovens e turbulentos do planeta invadindo as velhas, acomodadas e ineptas Atenas de uma civilização envelhecida pelo egoismo e pela imprevidência, que não pensou no futuro, não se preparou mas, acomodou-se no imediatismo e condenando seus filhos e netos ao padecimento das consequências?
Ou haveria no entretempo uma virada? De alguma forma, as reservas de amor e de lucidez seram capazes de prevalecer sobre essas tendências tão negativas que se esboçam, e deitar raizes de uma solidareidade e de uma governança global fraterna e sensata? Seremos capazes de estabelecer essas alianças que, como Marina diz, não só apenas entre os que hoje habitamos esse mesmo planeta mas, também com as futuras gerações, com quem voce poderia ter vindo a ser. Com quem insistiremos, Tixa e eu, que ainda por vir.
Com seus nove milímetros e nove semanas de vida tentativa voce me deixou a imensa humildade e a imensa esperança dessa reflexão.
Com seus nove milímetros e nove semanas de vida tentativa voce me deixou a imensa humildade e a imensa esperança dessa reflexão.
Belo e tocante artigo de quem une à dor pessoal, incomensurável, à dor de homem lúcido e guerreiro que vê seu planeta condenado por conta dos desvarios de uma civilização louca e egoísta.
ResponderExcluirSinto muito por sua dor individual, de pai.