Em
relação às questões climática e ambiental o novo governo apresenta sinais contraditórios previsíveis. Comecemos pelos aspectos preocupantes: na medida em que ele
encarna mais organicamente a atual base parlamentar tendem a aumentar as pressões em
relação a terra indígenas e a potenciais retrocessos no licenciamento ambiental. Haverá certamente tentativas
dos setores mais trogloditas do ruralismo e do desenvolvimentismo, do modelo
anos 70, para fazer avançar suas agendas.
Por outro lado, por mais que se
justifique um alerta, não vejo motivo para pânico. Mesmo com toda maioria de
que dispõem essas forças retrógradas terão que enfrentar resistências muito
fortes não só na sociedade civil, mídia, MP e do judiciário como também em setores do
próprio novo governo que já avisaram que irão aceitar que se faça tábula rasa do
licenciamento ambiental.
Isso não significa que não possam haver aperfeiçoamentos
nos processos de licenciamento e na tramitação da burocracia federal, historicamente
emperrada. Penso que o diálogo para tanto com todos os setores é positivo. No
caso das terras indígenas é totalmente inaceitável passar para o Congresso sua
demarcação mas há outros aspectos eventualmente passíveis de diálogo.
O novo
ministro Blairo Maggi certamente representa o agronegócio, é o "rei da soja", mas
não vejo que seja pior que a Katia Abreu. Ela era mais raivosa em relação aos
ambientalistas, em geral, e o Maggi mais susceptível a diálogo. Na questão climática
ele certamente é mais aberto, interessado, aceita agricultura de baixo carbono e há um terreno
de entendimento em torno da ampliação do Plano ABC. A grande dificuldade durante a
batalha do Código Florestal era a implícita mais clara relação entre a extensão
das APP e Reserva Legal com o preço das terras o que dificultava qualquer acordo
negociado com os ruralistas. Superada essa fase e estabelecida uma certa convergência em relação ao
CAR, há espaço para entendimentos.
Existe também um interesse mútuo em atrair
potenciais bilhões de dólares internacionais para reflorestamento e agricultura
de baixo carbono, não só nos 32 milhões de hectares previstos no INDC brasileiro
mas nos restantes 28 milhões que ainda sobram de pasto degradado. O Brasil é,
de longe, o país que mais pode ganhar em créditos de carbono, prestação de serviços
ambientais e precificação positiva da redução/remoção de carbono.
Apenas a
China tem áreas da mesma extensão para recuperar mas são desérticas. O maior
problema a ser equacionado com o novo ministro da agricultura é o desmatamento
legal no Cerrado onde a reserva legal é de apenas 20% (na Amazônia é de 80%).
Será necessário criar mecanismos econômicos para viabilizar a preservação das
florestas fora de reserva nessa região onde o desmatamento segue muito preocupante.
Nas
áreas de meio ambiente e de minas e energia as noticias são boas porque os
novos ministros, Zequinha Sarney e Fernando Coelho, são, no primeiro caso, um velho aliado do movimento ambientalista e, no segundo, um jovem parlamentar que manifesta forte
interesse pela questão das mudanças climáticas, eficiência energética e
energias limpas.
No caso do Zequinha tive a satisfação de ver aceita a sugestão
que fiz para a secretaria de mudanças climáticas do competente e dedicado
ministro conselheiro Everton Lucero que teve destacado papel na COP 21. Foi meu
grande parceiro na viabilização do parágrafo 108 da Decisão de Paris que
reconhece o valor econômico e social da redução/remoção de carbono algo quer no
futuro vai se converter num poderoso instrumento para financiar a transição para uma economia de baixo carbono
e, mais a frente, carbono neutra.
Assim,
apesar de todas as dúvidas que tive (e tenho) sobre o processo mais geral que
levou a essa mudança de governo –ainda eventualmente reversível— devo admitir
que, pelo menos nessa área onde se dá minha atuação no dia a dia, há razões para otimismo. Meno male.
Por
outro lado, estou entre os que estranham a não-participação de mulheres e de
negros no primeiro escalão do governo e a supressão do ministério da cultura
que poderia, pelo contrário, ter incorporado o do turismo, no que seria uma solução
muito melhor.
Na
questão macroeconômica não tem muito jeito. O governo do PT, por ter abusado e
deturpado os mecanismos ditos neo-keynesianos, não deixou praticamente nenhuma margem para
grandes investimentos públicos, a curto prazo. Isso nos torna dependentes basicamente
do afluxo de capitais privados internacionais que, nesse momento, são abundantes, no âmbito global, mas que só virão para a
economia brasileira dentro de certas condicionantes de "confiança" e equilíbrio fiscal quer
podem eventualmente nos desagradar e soar injustas ou caudatárias der uma certo
fetichismo de economia clássica (a esquerda xingaria de “neo-liberal”).
Infelizmente
vamos ter que passar por isso da mesma forma com que não haverá como fugir de
um adiantamento da idade mínima para aposentadoria. Quanto mais rápido se
concretizar um quadro que devolva a confiança no médio e longo prazo da economia tanto mais
rápida virá a recuperação para sairmos do terrível buraco que nos encontramos.
Nosso futuro não está na velha economia mas na nova. A Petrobras, por
exemplo, não vai se recuperar da
catástrofe insistindo no Pre Sal como tábua de salvação muito menos vendendo as suas partes
que podem ajudar a transforma-la numa empresa de energia, não apenas de
petróleo. Esse foi um rumo que começou a ser esboçado depois do desastre do
derramamento de petróleo de 2000, na baia da Guanabara e, depois, foi revertido
pelos sindicalistas que tomaram conta da empresa nos governos do PT, como os
resultados que se conhecem.
A saída
da crise atualmente é diretamente proporcional à capacidade que o Brasil tenha
se se colocar para o mundo como país com maior potencial para promover a
remoção de carbono da atmosfera via mega reflorestamentos e agricultura de
baixo carbono; palco privilegiado das energias limpas; país de cidades sustentáveis e que busca um novo
padrão de indústrias para o século XXI. O momento atual desafia a confirmação dos
ditos populares que que crise também é oportunidade e de que Deus escreve certo
por linhas tortas.
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