(integra do artigo publicado ontem em O Globo)
Nesses ásperos tempos, a única certeza é o
engarrafamento. Há dias, um acidente com um motociclista na avenida Brasil
paralisou boa parte da cidade. Governantes nos garantem que dos tapumes que
pululam na nossa paisagem virão as soluções: os BRT (Bus Rapid Transit), o VLT
(Veículo Leve sobre Trilhos) e a extensão do metrô até a Barra. Cada um
representa um potencial progresso na mobilidade carioca, ainda que o inesperado
faça uma surpresa, como no samba canção. Teremos, enfim, uma ruptura do padrão dos
novos viadutos e avenidas para automóveis, logo adiante engarrafados? Isso representará,
de fato, uma revolução na mobilidade carioca?
Não é tão evidente assim. Não obstante essas três intervenções tinindo
de novas, dois de nossos mais tradicionais meios de transporte públicos, os
trens e as barcas, continuam atendendo mal e porcamente; dentre as obras em
curso, várias tendem a estimular mais ainda o uso do automóvel e, diga-se de
passagem, com considerável desperdício. Vejam aquela bizarra ponte estaiada -
desproporção ímpar, monumento ao desperdício de concreto - na (sorria!) Barra...
Sem demérito ao BRT e muito menos ao VLT e
metrô, a eficiente mobilidade numa megacidade depende de uma teia complexa, interdependente
e inteligente entre vários modais integrados entre si. E, também, de se
conseguir pagar a tarifa dois ditos cujos!
Existe um pressuposto básico, inicialmente muito impopular que poucos
governantes ousam e que só cai no gosto da classe média automóveldependente bons tempos depois: limitar os espaços do
sacrossanto carro. Amsterdã começou suprimindo vagas de estacionamento, Londres
estabeleceu a hoje consagrada taxa de congestionamento – na época, quase trucidaram
o prefeito Ken Levinston. Eu quase arrolo o Rio nesse rol, com a meritória demolição
da Perimetral, não tivesse uma via expressa sido colocada, no seu lugar, na Rodrigues Alves, meio que trocando ali seis
por meia dúzia.
Para que de fato essas obras redundem numa
mudança de qualidade da mobilidade carioca muitas coisas ainda serão
necessárias: limitar, com pedágio eletrônico, o uso do automóvel em áreas e
horários críticos. Suprimir estacionamentos onde há bom transporte público. Disponibilizar
carros elétricos num sistema similar ao da bicicletas laranjinhas. Desenvolver o transporte hidroviário da Praça
XV à Barra (em menos de 30 minutos) e, a partir daí, em toda bacia entre o
canal da Joatinga e o de Sernambetiba - desde que, naturalmente, os canais
sejam limpos e despoluídos. A malha cicloviária foi, em fim, retomada, mas falta-lhe
um toque de qualidade e uma melhor integração com outros modais.
A revolução digital proporciona ao usuário o poder
de traçar seu próprio percurso da forma mais eficiente. Também contribui para
uma mobilidade urbana sadia - um bairro, de usos múltiplos, com o essencial do
que se precisa: escritórios, comércio de rua, serviços, equipamentos culturais
e, certamente a oferta uma melhor infraestrutura de conexão, em casa, prescindindo do deslocamento na hora do rush (se
bem que, no momento, todas as horas são de
rush). Mais: o Centro precisa acolher moradia em grande escala, inclusive de
classe média. Com isso, milhares de viagens tornar-se-ão desnecessárias.
Finalmente: não parece coadunar com uma visão de uma moderna mobilidade a pura
e simples repressão contra alternativas a um sistema de táxis que precisaria
atender melhor ao seu pressuposto como serviço. Palavras chave “atender” e “serviço”
encontram-se bastante desassociadas de outra, de desejada parceria que faz candente
falta no contexto carioca: qualidade.
Meus irmãos ficaram num engarrafamento que durou cinco horas,na Alemanha Pensei na construção de rodovias aéreas
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