08/10/2012

Confirma-se o segundo turno no primeiro


 Como escrevi aqui, o voto útil, no Rio de Janeiro, é uma jamanta. Tivemos portanto essa polarização desigual. Eduardo Paes foi consagrado com uma reeleição muito expressiva: 64% do voto válido. Freixo surfou sua onda até o limite: 28%. Como pretendia –numa situação muito mais favorável—foi eleitoralmente além do que Gabeira havia ido no primeiro turno de 2008, mas, pela mesma razão --a ausência de outros candidatos fortes--  deixou de ir ao segundo turno. Paes venceu em todas as zonas eleitorais com exceção da decima sexta, a grande Santa Teresa que na verdade fica mais em Laranjeiras.

 Os outros candidatos tiveram um desempenho muito modesto, na casa de 2% e 1% e Aspásia não conseguiu o bronze. Seu resultado foi principalmente produto das circunstâncias de voto útil e assemelha-se ao de Chico Alencar, em 2008, que obteve 1,8% do voto válido. Ele que já havia conquistado 23%, em 96, pelo PT. A aliança das duas grandes lideranças do ciclo precedente, municipal e estadual, César e Garotinho não chegou a 3%. A cara dessa eleição é a da consagração do prefeito, por um lado, e do voto politicamente correto, radical, do outro, com a jamanta do voto útil deixando um espaço micro para o resto. Enfim, com eu previa aqui: foi o segundo turno no primeiro.

 No seu momento de consagração tanto Paes quanto Freixo entram, imediatamente,  numa zona de grande perigo. Paes, pela maldição do segundo mandato e pela tendência carioca de colocar lá em cima para derrubar em seguida. Até agora nenhum dos reeleitos, tanto no plano estadual quanto municipal, inclusive dos que o fizeram no primeiro turno, foi feliz no segundo. Brizola, César Maia e Sérgio Cabral --e de certa forma Rosinha, como preposta de Garotinho--  foram todos infelizes nos seus segundos mandatos de reeleição ou de regresso (Brizola). Paes vai ter que se reinventar num momento crucial para a Cidade e transcender a si mesmo, para ter sucesso e contrariar essa “escrita”.

 Freixo conhecerá o post-festum dos campeões morais. Um resultado exultante mas  aquém da vitória tem um day after muito complicado. Depois da linda campanha de Gabeira de 86 --que abraçou a Lagoa, não o Maracanã--  o PV imediatamente entrou em crise e guerra interna e Gabeira se retraiu. Quem acabou capitalizando 86 foi o PT.  Jorge Bittar foi o Freixo da eleição de 88. A campanha de Benedita (92) e Chico Alencar (96) contiveram “vitórias morais” de bom calibre, sem grandes desdobramentos posteriores. `A de Gabeira,  em 2008, sucedeu  aquela para governador, em 2010,  ainda volumosa mas que já não mais o levou ao segundo turno, --no estado é muito mais difícil--  e trouxe depois um esgotamento de possibilidades de aliança.  Já o exemplo mais radical de um post-festum desastroso foi a recente tragédia dos verdes com  a malversação suicida da campanha de Marina Silva 2010.  A campanha de Freixo vem minada por uma luta interna no PSOL e  por contradições entre uma extrema-esquerda dura e uma visão de tipo mais libertário que tendem a explodir, provavelmente, mais cedo que tarde.

A agonia do "voto de opinião"

 Na eleição para a Câmara notamos a continuidade da inexorável erosão do voto de opinião ou mesmo de um voto de confiança individual não vinculado ao assistencialismo. Nessa última modalidade temos o César Maria, com 44 mil votos, um resultado certamente muito aquém do que ele imaginava. A seguir vem o mais votado do PSOL, Paulo Pinheiro, com 28 mil. O de Pinheiro não é um voto de opinião puro, tem um componente corporativo importante do setor saúde. Em 2008 a votação “de opinião” maior fora a minha, como quarto colocado, com 47 mil votos. O próximo “de opinião” já vem com 23 mil, o veterano Eliomar Coelho, do PSOL. 

 Mas temos os voto de legenda,  diriam. Até que ponto um expressivo voto de legenda representa um voto de opinião? Em 2008, o PV e, agora, o PSOL tiveram uma quantidade  volumosa de votos de legenda. Sinto decepcionar, mas embora exista aí, de fato, um componente voto de opinião,  o atual voto de legenda é, na verdade, primordialmente,  um voto enganado (e não corrigido) para prefeito. 

 Explico: uma parcela significativa dos eleitores não sabe que vota-se primeiro no vereador e depois no prefeito. Imagina, como seria lógico, o vice versa. Vota no número do prefeito, e aí aparece a pergunta de confirmação do voto de legenda para vereador. Aí o nosso eleitor fica sem saco de corrigir e confirma. Depois repete o número, votando corretamente  para prefeito.

 A maior prova do que estou afirmando é o fato de nas duas ocasiões o voto de legenda do PMDB ter sido ainda mais alto que o do PV e do PSOL. Convenhamos, ninguém se identifica ideológica ou programaticamente com o PMDB, pode, no máximo, querer votar no "partido do prefeito" para ajuda-lo na governabilidade, mas, acreditem, a grande maioria o faz pelo engano já mencionada  que naturalmente tem a ver com a fragilidade da intenção de voto daquele eleitor pelo vereador no qual teria votado. Portanto, na sua maior parte, o voto de legenda não é um refúgio do  minguante voto de opinião.

 Claramente assistimos à prevalência do voto bairrista clientelista/assistencialista baseado em centros assistenciais e/ou do voto  chapa branca proveniente do uso  de máquina de governo. Secundariamente temos voto de tipo corporativista ou religioso (foram eleitos 5 candidatos e igrejas evangélicas). O voto celebridade dado a jogadores de futebol, radialistas ou figuras do show biz limitou-se à "mãe loura". 

 Ou seja, embora haja elementos de renovação presentes, como a expressiva performance de Freixo que eventualmente sinaliza uma "refundação petista", o fator de "avanço do atraso" continua a ser o dominante, nas eleições para vereador,  e acredito que nas outras cidades isso seja pior ainda. Na ausência de uma reforma política, as mesmas causas continuarão gerando os mesmos efeitos e a hegemonia da velha (ou nova/velha?)  seguirá impávida.

 Jurássicos tenderemos a ser nós, os do voto de opinião. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário