23/01/2013

Obama redescobre o clima



 Uma parte notável do discurso de posse do segundo mandato de Obama foram as alusões muito tempo ausentes à questão do Clima. Foi um discurso de lavar a alma pois transcendeu às tantas condicionantes táticas que prenderam Obama até a reeleição.  Obama unchained, Obama desacorrentado, para parafrasear o título do novo filme de Quentin Tarantino. Ele descortinou o conjunto de causas pelas quais pretende se bater no segundo mandato e o Clima finalmente figurou com o devido destaque. 

 Obama iniciou seu primeiro governo com uma participação de grande visibilidade mas pouca consequência na COP 15, em Copenhagen, em dezembro de 2009. Chegou com um compromisso de redução de 17% das emissões norte-americanas, até 2020,  usando o ano base de 2005 --o mesmo usado pelo Brasil, em contraste com Europa e Japão, do Anexo I do Protocolo de Kioto, que usavam 1990--  meta considerada muito insuficiente e modesta pelos cientistas considerando-se o fato dos EUA serem o segundo país maior emissor, com aproximadamente 20% dos GEE do planeta, quantidade um pouco inferior à da China.

 Embora o compromisso voluntário dos EUA em Copenhagen faça parte da lista de objetivos “assinalados” pela ONU, no ano seguinte os meios para tanto foram torpedeados pelo Congresso norte americano. A Câmara, então controlada pelos democratas, havia aprovado do Climate Bill, com o instrumento do cap-and-trade, com limite de emissões e mercado de certificados de redução de emissões. O Climate Bill, no entanto, não passou no Senado. Nem foi votado quando a liderança democrata percebeu que não passaria já que pelo menos quatro senadores democratas, de estados com minas ou termoelétricas a carvão votariam contra junto com os republicanos.

 Seguiu-se uma ofensiva de mídia fortíssima dos dos lobbies do carvão e petróleo  e do Tea Party republicano difundindo as teses negacionistas. Pesquisas realizadas na época mostraram um recuo na proporção de americanos que acreditava na existência de mudanças climáticas induzidas pela ação do homem. Foi o bastante para Obama recuar e colocar o Clima na geladeira.

 Esteve ausente da campanha eleitoral afora o discurso de investidura de Mitt Romeny que debochou do tema ao dizer que “enquanto Obama se preocupa com o nível dos oceanos eu me importo com as famílias norte-americanas”. Obama respondeu rapidamente dizendo que o Clima era um problema real mas logo passou a outros temas. 

 Nesse interim, no entanto, sucedeu um fato curioso: as emissões norte-americanas, na prática, começaram a baixar!  Certamente em consequências da contração do PIB ocasionada pela crise econômica mas também pela massiva exploração do shale gas (gás de xisto) que passou a ser competitivo com o carvão e substitui-lo massivamente nas termoelétricas. Entre 2010 e 2011 as emissões norte-americanas caíram 7% e no ritmo atual calcula-se que não haveria dificuldades em alcançar a meta voluntária anunciada em Copenhagen em relação a 2020, antecipadamente. 

 Por outro lado, por razões fiscais mais que ambientais há entre democratas e parte dos republicanos uma aceitação melhor que há alguns anos sobre a taxação do carbono, atualmente vista como menos difícil de se aprovada –desde que modesta--  do que o cap-and-trade.

 A essas duas boas noticias, shale gas e menor resistência  a uma pequena taxa sobre o carbono soma se o recuo das teses “negacionistas” por parte inclusive de cientistas contratados pelos ditos cujos e também os efeitos do verão mais quente da história, os danos da estiagem à agricultura americana e a tragédia do furacão Sandy.

 Mas nem tudo é progresso. Na falta ainda de uma legislação ou regulamentação limitando legalmente emissões,  a mera substituição do carvão pelo shale gas nas térmicas  pode ser um processo reversível dependendo de flutuações do próprio mercado. A exploração do gás --mal comparando, um pré-sal em terra--  a grande profundidade com técnicas agressivas provoca efeitos ambientais locais, inclusive sobre o lençol freático e,  mais grave, pode ser acompanhanda de vazamentos de massivos metano --gás 21 vezes mais agressivo que o CO2 para o “efeito estufa”, embora de menor permanência na atmosfera--  que eventualmente compensariam negativamente os ganhos da substituição do carvão pelo gás no processo de geração de energia. Ainda não há estudos conclusivos sobre esses vazamentos e sobre sua dimensão cumulativa. 

 De qualquer maneira a redescoberta do Clima por Obama “unchained” representa um dado positivo. Aguarda-se que a ação siga as palavras. Se há muitas coisas que dependem do Congresso dividido e que possivelmente não passarão na Câmara, dominada pelos republicanos, outras Obama pode, através de normativas da EPA, a agencia ambiental federal, determinar limites para emissões de GEE. O cap que pode ser decretado pelo executivo. O trade, com a regulamentação do comércio de redução de carbono, que funcionou nos anos 80/90 para acabar com as emissões de SO2 e com a “chuva ácida”, terá que esperar pelo Congresso. Certamente será mais fácil se antes a EPA de Obama decretar o cap com limites para emissões de GEE nas diversas atividades econômicas.


Nenhum comentário:

Postar um comentário