25/11/2019

O desmatamento "cultural"

O presidente Jair Bolsonaro tem razão quando afirma que o desmatamento “é cultural”. Sabe do que fala, é sua essa cultura. Procurou impedir –possivelmente incorrendo em crime de responsabilidade—a destruição de tratores com correntões, motosserras, barcaças de garimpo clandestino e outros equipamentos. Coibi-lo representa uma dificuldade e um risco adicional à combalida fiscalização ambiental que tanto odeia. Incitou à invasão de terras indígenas por desmatadores e garimpeiros, tentou intimidar e desmoralizar o INPE, órgão de excelência científica, respeitado em todo o mundo e promoveu o desmonte de estruturas e normas de proteção ao meio ambiente, clima e biodiversidade rifando recursos à fundo perdido ao Fundo Amazônia.

 Já tivemos governantes de diferentes quadrantes que sacrificaram o meio ambiente para favorecer, legal ou ilegalmente,  interesses econômicos. Embora isso certamente seja o caso dele também, há algo mais: o ódio idiossincrático à preservação do meio ambiente e da natureza brasileira que  remete `a “esquerda”  empacotando-a num esdrúxulo  “globalismo”, variante moderna do marxismo,  uma conspiração internacional de contornos obscuros.  Na verdade, a performance ambiental do comunismo foi catastrófica ilustrada pela morte do Mar de Aral, na URSS e pela tragédia de Chernobil. Aqui, quando articulamos o Partido Verde, nos anos 80, a maioria da esquerda considerava ecologia um “diversionismo”.  Posteriormente, parte dela passou a levar em conta o tema, mais para ter  “bandeiras de luta” suplementares do que para fazê-la avançar na vida real.

 Para Bolsonaro, meio ambiente é “coisa de comuna” muito embora alguns de seus maiores pioneiros tenham sido militares bem distantes desse viés: o marechal Cândido Rondon, o major Manuel Archer, o almirante Ibsen Gusmão. Psicologicamente o presidente se identifica mais com o garimpeiro ilegal que invade a terra indígena e polui seus rios com mercúrio, o grileiro desmatador que se apropria da terra pública desmata, coloca uns bois magros sobre ela e vende para seguir adiante com sua ação especulativa logo legalizada por um sistema cartorial corrupto e políticos venais.


 O agronegócio moderno cuja cultura é dinheiro, não ódios idiossincráticos, anda apavorado com os prejuízos às exportações. Nunca o filme do Brasil esteve tão queimado internacionalmente. Em 2013, estive numa reunião da União Europeia, em Bruxelas,  como parlamentar ambientalista,  para questionar seu protecionismo contra nosso etanol de cana garantindo aos europeus que ele provinha de regiões bem distantes da Amazônia. Agora Bolsonaro acaba de liberar seu cultivo na Amazônia e no Pantanal dando um belo argumento a esses protecionistas.  Pela legislação e normas vigentes, anteriores ao Acordo de Paris,  ainda relacionadas ao de Copenhagen(2009), as NAMA (Ações Nacionalmente Determinadas),  deveríamos chegar, em 2020,  a menos de 3 900km2 desmatados, na Amazônia. O PRODES verificou 9 750km2, de agosto de 2018, a junho de 2019. Em setembro, o DETER detectou aumento, em relação ao mesmo mês do ano passado, de 222%. Ou seja, seguimos em alta desabalada. Até porque é , sim,  uma cultura. E no poder.

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