Para Aspásia será crucial o voto feminino |
A eleição de 2012 é completamente diferente e
não sinaliza muitas surpresas. O prefeito Eduardo Paes parte como franco
favorito, com condições de vencer já no primeiro turno, salvo derrapagem o que, em
tese, é sempre possível. Marcelo Freixo
se coloca de forma a ocupar pelo menos boa parte daquele voto crítico de classe
média: um misto de UDN com antigo PT e antigo PV. É aquela parcela em busca da
“novidade” da vez. Aspásia parte como alguma dificuldade para ocupar esse
espaço por causa da crise do PV, um partido que nacionalmente optou pelo
suicídio ao escorraçar 20 milhões de votos,
jogar no lixo a oportunidade de tornar-se um partido de peso no cenário
nacional e romper acintosamente com sua própria história.
Aspásia tem ainda a chance de reocupar parte
desse espaço se utilizar bem o seu pouco tempo de programa de TV para mobilizar o eleitorado
feminino, fazer valer sua rica biografia, considerável experiência de serviço público e as realizações dos
verdes no Rio de Janeiro que não são poucas. É uma questão de poder de
comunicação e como dizia o velho Chacrinha: “quem não comunica se trumbica”. Sua “bala de
prata” é fazer um bom programa de TV e aproveitar de forma criativa os espaços do
RJ-TV para martelar os três pontos que menciono acima. Única mulher, rica
trajetória e realizações dos verdes.
Otávio Leite vai dispor de um bom tempo de TV
e tem uma presença simpática, possui experiência de prefeitura e se liga a um
causa bem vista, a dos deficientes físicos que lhe asseguram aquele patamar
mínimo. Sua dificuldade encarnar um arquétipo político que o prefeito já incorporou melhor que ele. Também é prejudicado pelo pouquíssimo
entusiasmo que os tucanos suscitam por aqui. O polo Garotinho-César tem como ponto forte a
base popular do ex-governador, a grande experiência e tecnologia eleitoral do
ex-prefeito e o charme e poder de comunicação da vice Clarissa. Fosse ela a
candidata, Freixo teria problemas em conservar o segundo lugar. Rodrigo tem
dificuldades grandes de estabelecer empatia com o eleitor. Os primeiros fatores
podem no entanto pesar mais que o segundo e redundar num certo avanço desse
polo de total pragamtismo, dependendo da qualidade do seu programa de TV e da
capacidade de mobilizar o publico evangélico e católico mais conservador.
O Freixo já terá consolidado sua posição de
segundo lugar e de candidato, nessa eleição,
do que chamo do voto “cavaleiro andante” da vez? É cedo demais para
concluir isso. Teremos um quadro mais claro dentro de uns quinze a vinte dias
quando o efeito do programa e das inserções de TV se assentar. Aproximadamente 35% do eleitorado não vai
votar em Eduardo Paes em nenhum circunstância.
Suponho que o potencial de um candidato
com este perfil “crítico” fique entre 15% e 25% do eleitorado, no primeiro
turno. Na eleição passada Gabeira teve que disputa-lo com Jandira e Chico
Alencar e acabou com 22%. Por outro lado, teve um tempo de TV relativamente
confortável e já dispunha de uma maior familiaridade com o eleitor carioca. E o Gabeira é uma figura carismática e popular.
Freixo tem a vantagem de um campo muito mais
livre, sem uma Jandira e com o Chico naturalmente ao seu lado. Aspásia corre em uma faixa que
tem sobreposições mas não é exatamente a mesma. O "calcanhar de Aquiles" do
Freixo é pura e simplesmente o fato da eleição ser para prefeito da Cidade do Rio
de Janeiro. As implicações disso irão tornando-se mais evidentes
para o eleitor com o amadurecer da campanha. Uma grande parte do voto “crítico”
ou “voto atitude” que ele atrai não vai levar isso em conta nem tentar imaginar
de fato o que significaria ele vir a ser o prefeito do Rio, em 2013. Para este tipo de eleitor é menos importante saber quem vai governar o
Rio, nesse período crucial --e como vai governar-- do que simplesmente “se expressar” através de
um voto desabafo, anti-establishment político
que, aliás, no caso, será muito mais anti-Cabral do que, propriamente, anti-Paes. A acumulação de força para voos futuros e não governar
a cidade é o propósito do PSOL. É legítimo. A rigor, o único aspecto nocivo é quando isso passa a
obscurecer as informações que o carioca precisa ter sobre
sua cidade, favorecer políticas destrutivas, interesses corporativos e
atrapalhar bons projetos ou soluções práticas necessárias nas quais, via de
regra, o ótimo é inimigo do bom.
Vou dar alguns exemplos: não sei se O Globo
reproduziu corretamente e no contexto apropriado aquela sua colocação mas fiquei
chocado com a referencia atribuída ao Freixo à “Minha Casa, Minha Milícia”. Ao programa de habitação federal público-privado Minha Casa, Minha Vida cabem vários
questionamentos. Sobretudo não estar conseguindo atender
suficientemente --e não é fácil-- o
segmento de mais baixa renda, no Rio e em outros lugares. Como fazê-lo é uma discussão nada trivial e que
os candidatos deveriam fazer na profundidade que merece, sem frases de efeito
bobas como aquela. A realidade é que a prefeitura, antes, não tinha uma política habitacional nem
participava de projetos de habitação. Limitava-se à --também meritória mas
insuficiente-- urbanização de favelas.
Com todas suas limitações o Minha Casa é um programa importante e auspicioso,
pois, pela primeira vez nas história do
Brasil, está se criando uma forma de
prover moradia, legal e regular, a
segmentos que historicamente dependiam totalmente
da auto construção, das favelas e loteamentos clandestinos para morar.
Por outro lado, a ideia de que a área portuária
deva ser o “locus” dos projetos habitacionais de baixa renda é totalmente infeliz.
A área portuária de mesma forma que outros pontos do Centro devem, sim, conter projetos de habitação de baixa renda
num cronograma inteligente que os coloque
na sequencia do sucesso de projetos de moradia de classe média, inclusive para
acessar um mercado de trabalho. Se começarmos ali pelos projetos de
baixa renda a classe média não virá e sem moradia de classe média não haverá
revitalização da área portuária nem oferta de empregos. Um perímetro de prédios comerciais e alguns equipamentos cercados de moradia de baixa renda é uma receita de fracasso patética. É um tipo de raciocínio que só
favorece o impulso atual, agravado pelos Jogos Olímpicos, de privilegiar a
moradia de classe média na Barra e prejudicar a difícil empreitada de atrai-la
para o Centro, que me orgulho de ter iniciado. Também não adianta ficar
hostilizando infantilmente os empresários e achando que simplesmente taxar
terrenos ociosos vai leva-los a investir. A probabilidade maior é a da
inadimplência e do abandono. Precisam ser estimulados a investir no Centro porque seu impulso natural é a Barra.
Até
que ponto é legítimo explorar o bom trabalho que ele fez na CPI das chamadas
milícias, das ameaças que teria sofrido e de sua “ponta” no filme Tropa de
Elite 2 para a campanha eleitoral? Cada um faz o marketing político que pode e para quem não tem os exuberantes
meios materiais do prefeito isso aparentemente é a salvação da lavoura. O Padilha
foi muito patrulhado politicamente pela esquerdinha intelectual por causa da
Tropa de Elite I, que, aliás, como filme foi muito melhor do que o segundo.
Embora ele tenha dito, na época, que as
críticas “de esquerda” não o afetavam
resolveu fazer o Tropa de Elite II “politicamente correto” e até colocou Freixo de figurante.
Agora, na campanha eleitoral, este faz valer
essa “ponta” e também a escolta policial que o acompanha em função das ameaças
que consta ter sofrido. Sinto em relação a isso o mesmo desconforto que em
relação à possibilidade frequentemente anunciada do Beltrame iniciar carreira
política. O trabalho com segurança é tão importante que deveria ser ao máximo
afastado das lides da política eleitoral que inevitavelmente acaba por
fragiliza-lo. Policiais, magistrados e promotores com ambições eleitorais
correm o risco de comprometer de diversas formas seu trabalho vinculado a
segurança cidadã e à justiça. No caso, no entanto, é um parlamentar que legitimamente
“capitaliza” um trabalho que realizou no legislativo. De qualquer modo, para alguém desprovido de qualquer experiência executiva anterior, fazer da sua investigação parlamentar das chamadas milicias o
grande chamariz para a postulação de gerir uma megalópole de seis milhões de habitantes que vai sediar os Jogos Olímpicos, é de uma fragilidade óbvia que tende a se revelar mais a frente.
Nos EUA há eleições para os promotores de
justiça no âmbito dos distritos e estados. Os chamados District Attorneys são eleitos diretamente pelo povo. Não sei se é
uma boa coisa pois politiza muito a promotoria de justiça. Rudolph Giuliani,
Eliot Spitz e Andrew Cuomo são crias desse filão. De qualquer maneira, por
enquanto, a campanha de Freixo me evoca uma dessas para District Attorney. A prefeitura do Rio de Janeiro é toda uma outra
coisa. Em sua campanha de 2008, o Gabeira conseguiu aproximar-se mais da imagem
de uma figura que encarna o espírito carioca, capaz de relacionar-se com a
diversidade, mediar conflitos e interesses ainda que buscando uma distância salutar da política tradicional. Perdeu por uma margem pequena proveniente das áreas
que mais dependem da gestão pública e menos dispostas a um “voto
atitude”. Cheguei a acreditar na tese do "feriadão", mas depois, num exercício
que fizemos como Jairo Nicolau e sua equipe, acabou ficando claro que, ao contrário do
mito que nos foi conveniente, o feriado de Cabral não foi fator decisivo porque a abstenção foi ainda maior nas áreas onde Paes foi mais votado.
Na hora H o carioca de fato vota em quem vê
melhor na pele de gestor da cidade. Em tese, Aspásia teria alguma chance de combinar o “voto
atitude” com esse mais realista de gestão. Mas sua
tração inicial foi comprometida pela crise dos verdes e pela forma que a grande
mídia já pautou o casting do elenco
dessa eleição. Resta-lhe a bala de prata do programa de TV
dirigido pelo Moacir Goes. O material que vi parece bom. Ainda há tempo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário