11/05/2019

CARTA AOS MEMBROS DO FÓRUM BRASILEIRO DE MUDANÇA DO CLIMA



 
Soube ontem, pela manhã, pelo Oswaldo Lucon, da minha exoneração e de sua nomeação para o  encargo, não remunerado, de Coordenador Executivo do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima (FBMC). Não foi nenhuma surpresa. Esperava por essa medida, desde janeiro,  quando tomou posse o presidente Jair Bolsonaro. Como a decisão do governo de não extinguir o Fórum, conforme anteriormente fora anunciado, está suspensa, por enquanto,  a estratégia de fazer dele uma associação civil. Ela poderá, no entanto,  ser retomada a qualquer momento se houver motivos prementes para tal. Nossa postura inicial será a de fraterna colaboração com o novo coordenador executivo.

 Minha gestão  começou no final de 2016, quando desenvolvemos a campanha “Ratifica Já”, que permitiu ao Brasil aprovar, em tempo recorde,  e ser o primeiro país a Ratificar o Acordo de Paris, passando pelo Congresso e pelo Executivo. Nos dois anos seguintes reestruturamos o Fórum criando  suas nove Câmaras Temáticas e diversos Grupos de Trabalho que assumiram. entre outras tarefas,  a elaboração da Proposta Inicial para a Implementação da NDC Brasileira, um processo que durou um ano e meio, mobilizou 537 pessoas e 174 instituições, sempre buscando o consenso entre quadros do governo, terceiro setor, iniciativa privada e academia. Também produzimos um estudo pioneiro sobre as perspectivas para um Brasil Carbono-Neutro em 2060.  Foram realizados dezenas de eventos, seminários, workshops, etc.

 Entendemos sempre o Fórum como uma instância de Estado mais que de governo, porque projetos e programas de mitigação e de adaptação às mudanças climáticas têm prazos e desdobramentos maiores que essa ou aquela administração ou legislatura. Pautamos nosso posicionamento rigorosamente pela melhor ciência, pelo amor às futuras gerações e pelos interesses do Brasil. Entendemos que a mudança do clima traz enormes riscos para o Brasil mas que a transição para uma economia de baixo carbono/carbono neutra nos oferece um caminho de oportunidades para retomar o desenvolvimento econômico e alcançar mais  justiça social.

 No atual governo,  convivem negacionistas climáticos --no núcleo familiar do poder-- com gestores realistas que se pautam pela ciência e percebem os problemas de políticas de curto, médio e logo prazo que virão caso  não se levem em conta as mudanças climáticas, se continue a destruir a biodiversidade e poluir o meio ambiente.

 Está em curso um retrocesso de muitas décadas anos na forma de se encarar a questão ambiental, em geral, e, em particular a defesa das florestas e os direitos indígenas.  Facções criminosas invadem florestas nacionais para promover o desmatamento, a grilagem e o envenenamento dos rios com mercúrio.  Tais criminosos, bem representados na esfera política e governamental, comprometem a imagem do país e seu comércio internacional. Procura se ideologizar a questão ambiental num grau de primarismo de fazer dó. Enfrentar a crise climática não é uma questão de esquerdas ou direitas mas do destino das gerações de nossos filho, netos e bisnetos.

 O  planeta encontra-se numa trajetória de 4.5 graus e estamos perdendo a “janela de oportunidade” para dar mais ambição ao Acordo de Paris. Ele ficou muito aquém do necessário para evitar um futuro climático catastrófico mas foi um bom primeiro passo.  Vivemos um fenômeno internacional de retrocesso político e descaso climático. Internamente, isso se reflete numa política pueril e raivosa que pode causar danos irreversíveis.

 É nesse contexto que analiso o ato do presidente Jair Bolsonaro. Não obstante, estou oferecendo todo meu apoio ao novo coordenador Oswaldo Lucon, destacado membro do Fórum e técnico altamente preparado e comprometido com uma abordagem científica da crise climática.

 Da minha parte continuarei a desenvolver meu trabalho em diversas trincheiras que são as minhas. Pretendo assumir principalmente o desafio de ajudar os estados brasileiros a desenvolver sua ações de mitigação e adaptação e fazer frente aos seus desafios sócioambientais. Também estou comprometido em promover a visão da precificação positiva do menos-carbono (as ações de mitigação tendo um valor econômico intrínseco), que contribuí para colocar no Paragrafo 108, da Decisão de Paris, e com a  necessidade do pagamento por serviços ambientais.  Uma contribuição para sair da crise é  o reflorestamento, tanto da mata nativa quanto econômico,  numa escala inédita; a revolução dos bicombustíveis e da eletrificação nos transportes; uma avanço resoluto nas energias eólica, solar e no armazenamento de energia. São todas ações que contribuem com uma retomada dos desenvolvimento econômico.

Agradeço o empenho que todos tiveram em manter vivo e ativo o Fórum, nesse período. Foram dois anos e meio de trabalho intenso e dedicado por parte de todos.   Me despeço, com um simples “até logo” porque nossa ação não para nem esmorece.

Enquanto as posições que ocupamos são transitórias nossa causa e dedicação, permanentes.

Um grande abraço para todos,



Alfredo Sirkis

 10/5/2019














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