Atentar contra a integridade do MMA e dos
combalidos IBAMA e o ICMbio, só pode estimular o repique do desmatamento ilegal
com risco de voltáramos ao seu ápice, de 2004, quando chegou 27 mil km2. Caiu a
menos de 5 mil, em 2012. No ano passado, já estava em 6,9 mil, em ligeira queda
em relação aos dois anos anteriores. Acaba de sair a estimativa para 2017
(agosto a junho) com 7,9 mil KM2. O desmatamento na Amazônia (95% ilegal) volta
a aumentar. Tende a subir em flecha, no próximo ano, com a
continuidade da evasão de efetivos do IBAMA e, se não for revertida, a
sinalização do “liberou geral”, no governo Bolsonaro.
Os ditos ruralistas comemoram
mas a curto prazo, a agricultura brasileira ver-se-á internacionalmente
prejudicada em sua competitividade por desnecessários desgastes de imagem.
Evidentemente, sofrerá os graves efeitos do aquecimento global com mais
estiagens, falta d’água, mudanças no solo, variações loucas de temperatura e
inundações, dependendo da região. Por outro lado, o conjunto de ações de
agricultura de baixo carbono reduzem emissões e aumentam a produtividade.
Mitos podem ser instrumentais
em campanhas eleitorais. No entanto, uma vez no governo, a autointoxicação com fake news ou preconceitos é receita segura de
desgaste desnecessário. Vimos doses consideráveis disso em relação à questão
climática, na linha do: “não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe”.
Acaba de sair um relatório de 13 órgãos do governo norte-americano
--divulgado pela própria Casa Banca de Trump-- alertando para as
graves consequências econômicas para os EUA decorrentes da mudança do
clima.
Não, o Acordo de Paris em nada afeta nossa
soberania nacional sobre a Amazônia. Seu dever de casa se dá na
forma, voluntária, de uma Contribuição Nacionalmente Determinada (sigla em
inglês NDC). Na contribuição brasileira não há um compromisso com “desmatamento
zero”. Há de reduzir a zero, até 2030, o desmatamento ilegal. Numa
discussão rumo a avanços, subsequentes, aparece o conceito de “desmatamento
líquido zero”. Não significa que nenhuma árvore irá ser removida mas
que esse desmatado será compensado por reflorestamento, tanto de mata nativa
quanto econômico.
O Brasil possui, inclusive, um excelente
potencial para gerar “emissões negativas”, quando se sequestra mais carbono do
que se emite. Isso pode atrair variadas modalidades de investimentos e
financiamentos geradoras de atividade econômica e empregos.
O desmatamento legal, salvo em grande
projetos de infraestrutura, é licenciado pelos órgãos estaduais. O intenso ódio
ao fortemente desfalcado IBAMA e ao ICMbio não vem dos produtores rurais que
atuam dentro da legalidade nem do grande agrobusiness exportador mas de grileiros
ou garimpeiros criminosos que desmatam, envenenam rios
com mercúrio, em geral em florestas públicas. Reprimi-los
será agora mais da seara do ministro Sérgio Moro do que da combalida área
ambiental. São atividades criminosas.
Com mais de 60 milhões de hectares
de pastagens degradadas, a agricultura e a pecuária brasileiras não
necessitariam, em tese, avançar mais sobre a floresta. Digo “em tese” porque há
interesses locais, totalmente marginais em relação à moderna agricultura
brasileira, que faturam com a especulação imobiliária rural: grilagem de
terras --quase sempre públicas-- desmatamento para valorização no
“mercado” ilegal, venda irregular da madeira, pasto para uma pecuária marginal
de baixíssima produtividade. Economicamente isso é muito pouco relevante.
Em termos políticos é outra conversa
porque esses grileiros --no sul do Amazonas, vinculados ao narcotráfico-- são
cabos eleitorais eficientes. Cabalam votos para parlamentares que acabam
integrando a chamada bancada ruralista com uma influência desproporcional
a seu peso realidade econômico.
O discurso “de esquerda” contra todo tipo
de agronegócio por causa de sua natureza capitalista ajuda a valorizar esse
tipo de liderança ruralista menos representativa do setor produtivo. A
adesão da extrema-esquerda à causa ambientalista foi tardia --nos anos 80,
quando iniciamos, odiavam o tema-- e instrumental. Ela passou
a ser importante por fornecer uma bandeira de protesto adicional. Iniciativas
malconduzidas de reforma agrária com ocupações, sem uma estratégia produtiva,
também foram fator significativo de desmatamento. À direita e à esquerda
ideologizou-se um tema que não é ideológico.
Essa ideologização ressuscitou dois
mitos: à direita: o ambientalismo como uma causa “de esquerda” e que objetivaria
a que potencias estrangeiras ocupassem a Amazônia. Pioneiros da ecologia no
Brasil foram o Marechal Cândido Rondon e o Almirante Ibsen de Gusmão Câmara,
por exemplo. Não eram precisamente uns “comunas”... Quanto a roubarem
nossa soberania sobre Amazônia, francamente, nos últimos quarenta anos
participei de centenas de reuniões internacionais climáticas, em
dezenas de países e jamais ouvi tal disparate ser colocado, uma única vez
sequer.
A tal "Triplice A" é outro mito.
Trata-se de uma ideia de uma espécie de corredor verde ou APA
internacional juntando regiões da Amazônia da Colombia, Peru e Brasil é uma
ideia meio descosturada que algumas ONGs colombianas conseguiram
vender para o ex-presidente Manuel Santos que chegou a propor isso numa reunião
com Temer. Como afeta as áreas de fronteira houve uma preocupação dos nossos
militares que considero legítima. O Brasil, desses três países,
é o único a dispor de um instrumental de monitoramento
por satélite o que nos dá uma proeminência em relação aos vizinhos.
Até hoje não apareceu uma proposta objetiva e detalhada de como algo assim
funcionaria. Parece mais um factóide que uma proposta prática. Imagino que a
raiz da desconfiança possa estar no receio de que possa levar a coibição de
atividades de mineração que merecem uma discussão mais séria e objetiva
do que a forma com que foi tratada a questão da famosa RENCA.
Na questão indígena, concordo que o
uso da expressão “nações” pode dar margem a equívocos e deve ser evitada. A
soberania brasileira exerce-se na forma da Constituição e das Leis, no conjunto
do território nacional e ponto final. Mas a hostilidade em relação aos
indígenas que resistem com arco, flecha e tacape ao desmatamento e a
contaminação dos rios pelos desmatadores e garimpeiros criminosos é
injusta e estúpida.
A agricultura brasileira
será a primeira a sofrer com a mudança climática e graves danos ao meio
ambiente local. Irá, a curto prazo, prejudicar sua competitividade expondo-a a
um estigma e, a médio prazo, a efeitos mais rápidos e mais catastróficos do
próprio aquecimento global para além dos ambientais, locais. Teremos mais
estiagens, falta d’água, mudanças no solo, variações loucas de temperatura ou
inundações, dependendo da região, quando não alternadamente.
Todas essas questões deveriam ser alvo de
um diálogo objetivo e sem preconceitos. Até agora nada indica que sera o
caso.
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