Além do imenso retrocesso social, ambiental e
climático de subsidiar o diesel com recursos de áreas cruciais, totalmente, na
contra-mão do que seria estrategicamente necessário, o governo agora periga
enfraquecer o combate ao desmatamento num momento crucial.
O corte de R$ 4 milhões na fiscalização ambiental é uma
gota d’água no total do subsídio que concedeu, sob chantagem, ao diesel mas representa grande parte da verba necessária para
combater a ofensiva de desmatamento que iniciou-se nas últimas semanas e que periga
reverter o modesto avanço obtido no ano passado.
O Brasil
tem uma meta de ficar abaixo de 3900 km2 de desmatamento na Amazônia, em 2020.
Ela é anterior à nossa NDC do Acordo de Paris. Diz respeito ao NAMA instituído a
partir da COP 15, em Copenhagen, em 2009, e constituindo na Lei de Mudança Climática
12187/10. Ano passado, com todo esforço de redução, o desmatamento caiu de quase
8 mil km2, em 2016, para 6700. Ainda longe ainda da meta. Agora, R$ 4 milhões tungados da fiscalização
ambiental são pouco para financiar a
chantagem mas muito para pagar o mico de um eventual novo repique no desmatamento.
Justamente na hora em que a fiscalização se intensificava para preveni-lo.
Clamores idiotas
No blog anterior eu comentava a crise de autoridade que vivemos. Vejo uns idiotas querendo pegar carona nos caminhoneiros para fazer rodar para trás o relógio da história.
Em 1964, eu tinha 13 anos. Era um adolescente bastante politizado --lacerdista-- e como toda minha família apoiei aquele movimento que se autodenominou Revolução de 64. Três anos depois, completamente desiludido e, como boa parte a classe média carioca, guinando para a esquerda passei a considerar aquilo o Golpe de 64.
Na
verdade, o 31 de março não foi nem revolução nem golpe. Foi uma cavalar crise
politico-militar e uma rocambolesca comédia de erros que acabou numa tragédia de 25 anos. O
governo de Jango era uma zona. Meu amigo Darcy Ribeiro não tinha razão quando
dizia que “caiu por suas qualidades, não por seus defeitos”. Caiu foi mesmo
pelos seus defeitos, cavalares, de forma vexaminosa. Caiu de maduro. O discurso de
Jango, no Automóvel Club, no qual estimulou uma quebra de hierarquia nas Forças
Armadas foi a gota d’água.
Havia
sim uma conspiração golpista em curso, inclusive com apoio dos EUA, no contexto
de Guerra Fria, mas o que aconteceu, no dia 31 de março, foi a sublevação de um
general porra-louca, Olímpio Mourão Filho, como reação àquele discurso. Mourão surpreendeu
a todos, em especial aos conspiradores de mais alto coturno como os generais
Castelo Branco e Golbery do Couto e Silva. Mourão sublevou um pequeno quartel
em Juiz de Fora e rumou para o Rio. O governo Jango tinha um esquema de
sustentação militar poderoso que ruiu como um castelo de cartas diante de sua
incompetência política.
No que
pese alguns golpes de mão como a ocupação do Forte Copacabana, a tapa, o essencial do movimento foi telefônico e
radiofônico. Contou com a adesão dos líderes civis: Carlos Lacerda, Magalhães
Pinto e, relutantemente, Adhemar de Barros, governadores da Guanabara (ah, que
saudosa!), Minas Gerais e São Paulo. A peça chave foi o general Amaury Kruel,
comandante do II Exército, amigo de Jango, que decidiu abandona-lo depois que
esse se recusou a “romper com os comunistas”. Na verdade, tudo ficou definido
quando Jango resolveu fugir para o Rio Grande do Sul, onde seu cunhado, Leonel
Brizola, não conseguiu repetir seu feito de 1961. Logo fugiria de novo, um
pouco mais ao sul, para o outro lado da divisa com o Uruguai.
64 foi
uma crise político militar com um desfecho de fuga presidencial e uma eleição
pelo Congresso do general Castelo Branco. O golpe --na verdade, sucessivos golpes-- aconteceu em seguida quando foram editados os
Atos Institucionais, as eleições previstas para 1965 foram canceladas, um novo
general, Costa e Silva, foi imposto e referendado pelo Congresso, quando depois
o Costa e Silva, diante dos protestos de
rua, parlamentares e das ações armadas, decretou o AI 5 e, finalmente, quando sofreu um derrame e seu vice, Pedro
Aleixo, foi escorraçado por uma junta militar.
Os brasileiros ficaram sem o direito de votar e se exprimir livremente, a imprensa foi censurada e a tortura proliferou
e, pela segunda vez –a primeira foi o
Estado Novo-- atingiu a classe média. Nesse
ínterim muitos jovens, como eu, que inicialmente ficaram felizes com a queda de
Jango foram se radicalizando e, em protesto a supressão das liberdades acabaram
–paradoxalmente—abraçando uma ideologia não menos liberticida, embalados por um romantismo revolucionário que
assolava o continente e boa parte do mundo a partir de 68. Havia também militares
bem intencionados que foram soterrados pelos colegas afoitos, sedentos de poder
e por muitos civis que ganharam muito dinheiro e roubaram muito a sombra da
ditadura. Houve também muita corrupção mas ela não podia ser noticiada e o judiciário
foi também dominado pelo regime.
As lições
de 64-85 são implacáveis e estão nos livros de história. A atual geração de
comandantes militares não possui a ânsia de poder político daquela de 64 que
vinha se avolumando, ao curso de sucessivas crises e quarteladas, desde os anos 20. Havia um tônus golpista
tanto de direita como de esquerda no tenentismo. Hoje o país é tremendamente
mais complexo e uma ocupação militar do governo ou de um caudilho apoiado num
esquema militar não só não resolveria nenhum dos problemas do país como poderia
resultar numa síndrome dos estados falidos e numa guerra civil.
Hoje a
quantidade de armamento circulando na sociedade é absurdo. No Rio, a mais
indigente quadrilha da menor favela tem mais armamento do que a maior das
organizações que combatiam a ditadura. A sociedade brasileira ficou
tremendamente mais violenta do que aquela dos anos 60. Qualquer atitude de desafio
ao estado de direto e estímulo à violência é hoje extremante perigosa e a
rapidez com que situações podem sair completamente de controle é tremenda.
O maior risco não é de uma nova ditadura militar até porque os militares absolutamente não a desejam --pelo menos os no comando-- mas a da síndrome dos estados falidos com mil ditaduras, locais, de senhores de guerra pós modernos, dominando comunidades, bairros, regiões.
O maior risco não é de uma nova ditadura militar até porque os militares absolutamente não a desejam --pelo menos os no comando-- mas a da síndrome dos estados falidos com mil ditaduras, locais, de senhores de guerra pós modernos, dominando comunidades, bairros, regiões.
Esse é o
maior perigo que ronda quando a autoridade colapsa.
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