28/11/2019

A provocação e a radicalização


Li as transcrições dos grampos telefônicos e as alegações do delegado que operou a operação contra os quatros voluntários ligados ao Saúde e Alegria, no Pará. A conclusão salta aos olhos: uma óbvia provocação urdida por uma conjura grileiro-bolsonarista.

Os quatro são acusados por um diálogo em que um deles prevê que os incêndios continuarão até as chuvas de dezembro e que o interlocutor terá tempo de filma-los. Nada há de comprometedor no diálogo a não ser que se lance mão de uma dose cavalar de má fé e desonestidade que claramente configura um criminoso abuso de autoridade. 

As alegações em relação a desvios de recursos com base a esses grampos também não se sustenta. A fonte dos recursos, a WWF, já desmentiu a ocorrência de qualquer tipo de irregularidade. 

E a autorização inicial para o grampo telefônico foi baseada em que?

 O procedimento do em questão juiz também é um sinal dos tempos e do abuso de autoridade que tornou-se praxe a partir do momento que a Lava Jato passou a ser utilizada para fins políticos. A prisão preventiva e sua prorrogação por pelo menos dez dias “para poder investigar” é de uma flagrante ilegalidade. Da mesma forma a busca e apreensão de computadores e arquivos do Saúde Alegria. 

 Trata-se de uma operação de contra-informação/provocação que vem desde cima e tem como objetivo  validar a tese bolsonariana de que as ONGs --e não os grileiros desmatadores já claramente identificados pela Policia Federal e pelo MP--  são os responsáveis pelas queimadas. Quanto cinismo!

 A imprensa vai levantar os antecedentes do delegado e do juiz e certamente virão a tona seus vínculos com quem se imagina.

 Creio que os colunistas que vem sistematicamente defendendo o descontrole ora existente em relação a prisões provisórias intermináveis e delações premiadas, como alfa e ômega de investigações,  podem agora apreciar como esses atentados ao estado de direito serão usados, cada vez mais,  daqui para frente se não houver um freio de arrumação. São armas para policiais, promotores e juízes com uma agenda apolítica e ideológica. O que começou como uma meritória ação para acabar com a impunidade dos corruptos no governo, no parlamento e em grandes empresas com o passar do tempo –é comum nas revoluções--  virou algo bem diferente.

 Aliás esse tipo de politização está patente na sentença do TRF 4 que condenou Lula a 17 anos de prisão.  Fique claro: considero Lula o grande responsável pelo "petrolão" e outras formas de financiamento corrupto da hegemonia do PT e de sua aspiração de permanecer indefinidamente no poder. Isso é politicamente evidente mas não foi juridicamente provado. O processo do apartamento em Guarujá é uma piada: Lula não dormiu uma noite sequer lá. Quando muito seria uma tentativa de... Condena-lo por “lavagem de dinheiro” por isso é simplesmente uma aberração jurídica.

  No caso do sítio, pode se dizer que Lula e família usufruíram do dito cujo mas também não foi claramente provada a “contrapartida” concreta de responsabilidade material do réu. E a sentença de 17 anos de cadeia --uma pena pra assassino--  de novo a pretexto de “lavagem”,  é mais uma aberração de juízes políticos que usaram dois pesos e duas medidas ao tratar do caso de sentenças plagiadas.

 Sou favorável à possibilidade de prisão em segunda instância e concordo que a espera do transito em julgado, com suas inúmeras possibilidades protelatórias favorece a impunidade. No entanto, o Congresso quando for modificar a Constituição nesse sentido precisará adotar certas salvaguardas em relação aos abusos de prisão preventiva e provisória, a deturpação do conceito de “lavagem de dinheiro” e a politização e ideologização de juízes.

 Também acho que os dados financeiros devem circular com agilidade para apoiar investigações que tenham mérito mas não podem ser usadas como instrumentos de poder nas mãos de policiais ou promotores políticos, com projetos de poder  ou corruptos. O sistema de checks and balances (pesos e contrapesos) é vital para democracia e nesse sentido o STF, no que pese alguns erros,  vem sendo, junto com o Congresso Nacional (com muito mais erros) baluartes em defesa da democracia e do estado de direito. Isso pela mão de personagens que até pouco tempo consideraria improváveis para esse papel.


 Voltando ao Lula e saindo do campo jurídico para o político. Seu comportamento, depois de solto,  com o PT sob seu comando  direto,  é para lá de lamentável. Declarações que servem de escadinha para a extrema direita. Ninguém mais, muito menos o PT, fabrica mobilizações ou convulsões sociais. Atualmente elas acontecem quase espontaneamente sem que esquerda ou direita as controle. 

 Lamentável é pretender que o PT não tem autocritica alguma a fazer quando é simplesmente o maior responsável pelo advento bolsonarista. A manutenção de Gleisi Hoffmann na presidência do partido é simplesmente um vexame tanto quanto a insistência deles em defender Nicolas Maduro e seu regime assassino, torturador e destruidor da economia e da sociedade venezuelana. 

 Quem poderá quebrar essa tragédia brasileira da polarização Bolsonaro versus PT? Para onde isso vai nos levar?

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