É provável que nunca apareça a verdade na morte do promotor Alberto Nisman. Mais ou menos como o assassinato de John Kennedy. Há muitos anos tenho um mórbido interesse pela tragédia de Dallas que tanto me chocou com meus 12 anos. Atualmente tendo a acreditar que havia mais de um atirador, que a cabeça dele foi destroçada por dois tiros praticamente simultâneos de diferentes direções por homens da máfia de Carlos Marcello e Santo Traficante com possíveis ligações com um setor da CIA e grupos anticastristas.
A causa principal seria a repressão à mafia comandada pelo capo Sam Giancana por parte do
ministro da Justiça Bob Kennedy, uma insuportável "ingratidão" pelo apoio eleitoral
da dita cuja (negociado pelo velho Joe Kennedy) nas eleições de 1960, no estado do Illinois (Chicago), decisiva para vitória sobre Richard Nixon, numa das disputas mais apertadas da historia dos
EUA. Essa teoria é a que me parece a mais plausível mas não sei, ao certo. Não
sabemos. E não saberemos como não saberemos das conspirações (ou não?) nos subsequentes assassinados de Bob Kennedy e Martin Luther King.
A morte do pobre Nisman parece tão complicada
quanto todas estas que marcaram os anos 60. Tecnicamente parece suicídio mas ele não parecia um nem um pouco suicida,
não possuia motivo aparente, não estava em depressão, pelo contrário seu ânimo
parecia combativo e beligerante. Não foi identificado nenhum indício de
interferência externa, arrombamento ou presença de ninguém estranho no
apartamento, o DNA encontrado na arma e
nas roupas era apenas dele, etc...
Mas seria, de fato, tecnicamente impossível o assassinato? Vamos imaginar: um grupo altamente profissional consegue entrar no
condomínio fechado de Puerto Madero mediante subterfúgio: entregadores de pizza, farmácia, visita a moradores, qualquer coisa assim.
Houve uma margem de tempo considerável para tanto. Sabiam (por grampo ou
informação privilegiada) que ele tomara
de empréstimo uma pistola 22 do auxiliar (eventualmente parte da trama). Possuíam, quem sabe, um sistema
de rastreamento dos seus movimentos previamente instalado no apartamento.
Entraram
sorrateiramente mediante técnica de serralheria quando ele estava no banheiro.
Localizaram a pistola tomada de empréstimo. Ao abrir a porta do banheiro ele foi
imobilizado e levou um tiro na cabeça a curta distância. Sua mão foi colocada na
arma. O assassino usava luvas. Saiu(iram) discretamente do apartamento e do
prédio, disfarçado(s) de alguém banal. Ou na mala de um carro com a cumplicidade
de algum morador ou empregado? Não parece impossível...
Mas quem, nessa hipótese, teria matado Nisman?
Como sua morte se encaixa na trama histórica política e de inteligência
envolvendo os atentados da AMIA (1994) e da embaixada de Israel (1992) e do suposto acordo secreto Argentina-Irã para
encobrir a participação de altos personagens iranianos no caso?
Acredito na versão de que os atentados tenham sido
praticados pelo Hezbollah em represália aos ataques “cirúrgicos” da aviação israelense contra seus dirigentes -- num dos
casos com vítimas “colaterais” de familiares. As relações do Hezbollah com o
Irã são íntimas e intensas, particularmente com a Guarda Republicana e sua unidade de
operações externas, a brigada Al Quds. É plausível o envolvimento da embaixada em Buenos Aires.
Há no entanto muitas zonas de vácuo. Atribui-se o
planejamento do atentado ao subchefe do Hizbollah, Imad Mughnyieh --morto em Damasco, em 2011, numa operação conjunta da CIA com o Mossad. Mas nunca se
identificou os autores materiais dos dois atentados. Foram
presos agentes da policia da província de Buenos Aires, depois soltos ao se
considerar seu indiciamento um diversionismo.
Também dá margem a dúvida o
envolvimento direto do ex-presidente Hashemi Rafsandjani hoje tido como um
moderado. Com base a quais dados comprovados se estabeleceu sua responsabilidade? Dados de inteligência do Mossad? Da CIA?
Embora tivessem atuado profusamente no
exterior nunca antes nem depois matadores a mando de Teerã
praticaram atentados indiscriminados deste gênero. Sua forma de atuação típica
era, sobretudo na década de 90, a
eliminação seletiva de opositores em capitais europeias. O apoio logístico que a embaixada iraniana
prestou pode ou não ter tido luz verde a nível presidencial. Parece haver até hoje uma
grande autonomia e até um padrão de rivalidade e desafio entre as várias facções de poder no
Irã.
Evidentemente,
teria que haver argentinos envolvidos --e
não faltam na Argentina antissemitas que o Hizbollah pudesse recrutar-- o problema
é que nunca apareceram. E Nisman que por longos anos investigou o caso,
por indicação do ex-presidente Nestor Kirshner, jamais conseguiu detecta-los
algo que, em tese, pareceria mais menos difícil que definir as responsabilidades precisas
na cadeia de comando iraniana envolvendo o ex-presidente Rafsandjani.
No último período Nisman se concentrou já não
mais em resolver todo esse quebra-cabeças mas em investigar a suposta decisão
da presidente Cristina Kirshner de “aliviar” o Irã abandonando as vítimas da
AMIA. Não resta dúvida que pode ter havido um movimento nesse sentido mas o
fato é que pouco prosperou. A Interpol nega que a Argentina tenha solicitado a anulação da ordem internacional de prisão contra os iranianos
acusados de envolvimento. Tanto na Argentina, quanto no Irã, houve oposição
política e obstrução à ideia da “comissão da verdade” argentino-iraniana para o
caso e não se vislumbra direito qual seria a grande contrapartida comercial que a
Argentina receberia.
Observadores absolutamente isentos, inclusive vários correspondentes
internacionais que cobrem o caso, avaliam que a peça acusatória de Nisman era
frágil. Mostrava que havia um lobby iraniano incrustado no governo e nos
“movimentos sociais” que fazem parte de sua clientela mas continha mais um libelo político do que propriamente uma causa criminal.
Paralela à história da apuração dos
dois horrendos atentados antissemitas e da tentativa de superar o contencioso com o Irã, corre uma outra, a do SIDE, o serviço
federal de inteligência argentino, uma
espécie de SNI on steroids permanentemente envolvido em espionagem política e mafiosa chapa branca,
manobras escusas, provocações e um onipresente “grampo” telefônico a serviço do poder e eventuais
compradores de informação comprometedora sobre outrem.
Durante muitos anos o
czar desse serviço foi Antonio Stiusso, um personagem obscuro, dentro do
negocio desde os tempos da ditadura militar, servidor dos diversos governos de cores políticas opostas e, em todo último período, fiel e temido
esbirro dos Kirshner. Homem de muitos contatos, inclusive com a CIA e o Mossad israelense, envolveu-se a fundo na investigação do
atentado da AMIA mas também nunca conseguiu identificar os executores diretos
argentinos e do Hizbollah. Usou muito dados provenientes desses dois serviços que lhe passaram informação de boa inteligência mas eventualmente dados politicamente direcionados para os objetivos estratégicos
dos respectivos governos.
Pois quis o destino que a cada vez mais escalafobética presidenta
Cristina K e o seu espião-chefe, herdado do marido, viessem a se desentender. Siusso --cujo melhor paralelo histórico parecer o temível chefe do FBI, J Edgar Hoover-- foi demitido por ela. Essa crise correu em paralelo como a fase mais recente de
investigação de Nisman e, nos seus últimos dias, com a comoção criada pelo massacre do Charlie
Hebdô em Paris. Siusso era uma das principais fontes de Nisman e a relação entre ambos, na reta final, é pouco clara,
inclusive em relação a uma derradeira comunicação telefônica.
Fontes citadas pela imprensa internacional
afirmam que a CIA trabalha com duas
hipóteses: 1 - a turma de Cristina K mandou matar Nisman para deter suas
denúncias (já que chegou até a rascunhar um pedido de prisão da própria presidenta...) 2 - Siusso tramou e executou a morte do procurador com requintes de
profissionalismo para vingar-se de Cristina K e ferra-la politicamente para o
resto da vida.
Perdoem-me os patrícios mas, do
ponto de vista estritamente lógico, a segunda hipótese parece-me algo mais plausível
que a primeira por menos que aprecie a atual ocupante da Casa Rosada, que vai arruinando um país pelo qual, diferente
de muitos, tenho imensa estima (salvo no
futebol). Até entendo a oposição argentina, exasperada com o desgoverno --inclusive minha amiga dos “anos de chumbo” deputada Patricia Bulrich-- surfarem politicamente nessa história mas, sinceramente, creio mais provável a
autoria Siusso que a de Cristina.
Menos
prováveis ainda que plausíveis: o Hizbolah, o Irã ou, por que não, o Mossad? De Netanhyahu tudo pode se esperar para
isolar mais o Irã e tentar melar as negociações nucleares com Obama. Ou, então, finalmente, voltando a ele, o suicídio. É verdade, há suicídios totalmente
inesperados, como raio em sereno, crises maníaco depressivas
repentinas, fulminantes. Nisman estava numa posição delicada com os holofotes
do mundo sobre ele, uma denúncia pouco
consistente e o bafo do muy amigo
Stiusso no cangote. Ou seja tudo é possível mas pouco plausível.
Alô, alô, madam Agata Christie and mister Conan Doyle comparecer com urgência ao balcão do aeroporto internacional de Ezeiza para dar desfecho literário decente a esse misterioso e exasperante tango nel labirinto.
Sirkis,você tem um trabalho tão lindo a fazer que acho um desperdício ficar tentando entender a lógica de mentes criminosas Deixa prá Ághata Cristie A vovó dá conta
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