(artigo publicado hoje em O Globo)
Confesso que hesitei em me envolver novamente
com um partido, 27 anos depois de ter fundado com Fernando Gabeira, Carlos
Minc, Hebert Daniel e Lucélia Santos, o PV, que presidi durante oito anos, representei
como candidato presidencial, em 1998 e cujo manifesto e programa redigi.
Na
cultura política brasileira, resultante
do sistema eleitoral que temos, os partidos
tendem a ser meras “legendas” para o somatório aritmético dos votos dos
aspirantes a uma carreira política individual. Perderam a função de portadores
de alguma visão de mundo a ser colocada na arena cívica, veículos de algum programa de governo ou
escolas de formação política. Como se
diz vulgarmente: aqui o buraco é mais
embaixo.
No atual sistema, da compra de voto e dos centros assistenciais, independente de quantos escândalos venham a
tona, dificilmente teremos grande progresso.
Apresentei na Câmara um projeto de
sistema distrital misto plurinominal (grandes distritos) aparentemente sem grande
chance de ser aprovado. Vivo atualmente um dilema em relação a continuar ou não
na vida parlamentar/eleitoral. E, no entanto, me envolvo outra vez na criação
de um novo partido... Por que?
Marina Silva obteve, em 2010, quase vinte
milhões de votos. Da classe média “iluminista”, da garotada de redes sociais,
de um contingente imenso de mulheres pobres. Foi um voto de esperança mais que
de “protesto”, fora da política tradicional e favorável à sustentabilidade ambiental
e ética, como denominador comum.
O PV não soube aproveita-lo, Marina, por sua
parte, se precipitou ao deixa-lo --na
minha opinião-- pois havia ainda campo
para um embate interno, mas isso não vem mais ao caso.
O “x” da questão é que
existe um contingente imenso de brasileiros que não aceita mais a política como
ela vem sendo exercida, desconfia do mero desenvolvimentismo produtivista,
comum aos grandes partidos, dá importância à questão ambiental e climática que
eles praticamente ignoram --quando não hostilizam-- e deseja mais transparência, decência e
idealismo na vida pública brasileira.
Essa gente não quer uma via extremada, sectária, aspira ao que seria
modernamente um centro radical. Será viável mais um partido, se já temos bem uns
trinta? Vale a pena tentar algo assim?
Me fiz essa pergunta meses a fio e, finalmente, me convenci quem sim ao ponderar a
alternativa: não fazê-lo. Deixar se perder, esvair, dispersar tudo aquilo que
20 milhões tentaram nos dizer, em 2010. Não
lhes dar pelo menos a oportunidade de tentar algo novo.
Sem ilusões ou fetiches
penso que, afinal, vale a pena dispor desse instrumento de participação e que
além disso é indispensável cultivar uma rede de
cumplicidades e de coordenação com os melhores quadros nos outros
partidos, na sociedade, nas
instituições, nas empresas. A Rede, mais que um partido, é um estado d’alma.
Continuemos nosso ativismo após décadas!
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