Conheço o deputado Bolsonaro desde o final dos anos 80 quando fomos ambos vereadores no Rio e sempre mantivemos uma relação civilizada. Não tenho a reação "pavolviana” que a esquerda em geral tem com ele porque percebo perfeitamente sua estratégia de provocação. Um terço de seu eleitorado é formado pelo segmento ideologicamente mais troglodita da sociedade. É uma extrema-direita política e cultural. Os outros dois terços são um voto militar e policial corporativo. Sua tática é dizer barbaridades para atrair atenção da midia para chegar nesse eleitorado. A esquerda e a midia acabam fazendo o jogo dele. Por isso encaro seu discurso com paciência e ironia e, em geral, deixo-o falando suas bobagens sozinho.
Hoje, no entanto, quis o destino que ele ocupasse a tribuna imediatamente antes do discurso para o qual eu me inscrevera para falar sobre o mais recente relatório do IPCC tratando da intensificação dos chamados fenômenos climáticos extremos: enchentes, secas, etc... Pretendia abordar a crise climática, o problema mais sério que vai afetar a humanidade nas próximas décadas, mas o Bolsonaro me antecedeu na tribuna com um discurso de ódio aos gays em que fez insinuações sobre a presidente Dilma Rousseff.
Seu pretexto foi o tal “kit gay” que ele garante ter sido reeditado mesmo depois do recuo do ministério da educação. Sou crítico em relação à forma pela qual esse assunto é abordado, como “educação sexual” quando o enfoque deveria tolerância com a diferença e direitos de cidadania. De fato alguns materiais são inadequados e o Guilherme Fiuza escreveu um bom artigo sobre isso alguns meses atrás no Globo. Mas isso é uma outra discussão. No caso do deputado o suposto "kit gay" é um mero pretexto. Me chocaram as expressões de ódio aos "boiolas" e o desrespeito à instituição presidencial o que me levou a mudar meu habitual comportamento de ignorá-lo para evitar promovê-lo como fazem muitos deputados de esquerda e jornalistas quando entram pavlovianamente no seu jogo dando-lhe mais atenção que merece.
Acabei tendo que dedicar um terço do meu discurso ao óbvio, para não me omitir diante da grotesca situação criada. Não é tolerável o discurso de ódio aos homossexuais. Opção sexual é uma questão individual e do fórum íntimo de cada um e a descriminação é sempre inaceitável. Por outro lado a instituição presidencial tem que ser respeitada e esse é um dever de decoro parlamentar.
Não sei se há outros fatores além da ideologia de extrema-direita e do oportunismo eleitoreiro por trás de tanto ódio a pessoas que compõem uma considerável minoria na nossa sociedade. Haveria uma série de teorias psicanalíticas de armário a respeito de tamanha obsessão. Mas não vem ao caso discuti-lo. A questão de fundo que quis colocar não é sobre opção sexual mas sobre democracia, respeito ao outro, tolerância e, em última análise, respeito a nossa Constituição. Há algumas semanas numa discussão sobre a revisão da anistia na Comissão de Relações Exteriores e Defesa ele gritou para o deputado Ivan Valente, do PSOL que esse iria “virar uma mocinha” se noutros tempos caísse nas mãos do DOI CODI. Escapou ao bravo capitão anti-gay que ele também viraria uma mocinha no pau de arara da KGB de uma ditadura "de esquerda"... Por isso prezamos a democracia, os direitos humanos e nos opomos a qualquer forma de ditadura, seja de que ideologia for. E defendemos a liberdade de expressão até mesmo para quem diz barbaridades como ele. Até porque o problema não é o tanto Bolsonaro, mas o fato de ele ainda dispor, no Brasil de 2011, de uma platéia e de um eleitorado que se identifique com as barbaridades que proclama.
MEU DISCURSO NA INTEGRA COM A PARTE SOBRE CLIMA
Nenhum comentário:
Postar um comentário